São Paulo, domingo, 24 de setembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Líder de Corumbiara ataca MST

GEORGE ALONSO
DA REPORTAGEM LOCAL

Em entrevista à Folha, Cícero Pereira Neto, 38, o "Topa-Tudo", petista, líder da ocupação de Corumbiara (Rondônia), defende invasões em massa. "É o momento. Temos de nos contrapor ao governo, que diz que quem ocupar não vai levar."
Para o ex-dirigente nacional do MST, o confronto de Corumbiara, em 9 de agosto último (morreram 10 sem-terra e dois PMs) virou uma nova referência do movimento sem-terra.
Ele afirma que o MST "não abarca todos os sem-terra" e ironiza os rumores de que militantes do Sendero Luminoso (grupo guerrilheiro peruano) estariam agindo no Brasil.

Folha - Você veio a São Paulo em busca de quê?
Cícero Pereira Neto - Corumbiara foi uma luta regional. A luta pela reforma agrária é maior. Vamos criar o Comitê Corumbiara para exigir a expropriação da fazenda Santa Elina e a punição dos culpados pela chacina. Procurei a CUT e vou ao MST.
Folha - Mas você é dissidente do MST e critica a entidade.
Cícero - É preciso que a direção do MST entenda que a luta pela terra não é só do MST.
Folha - Eles prejudicaram a ação de vocês em Rondônia?
Cícero - O MST nos colocou como cúmplices do massacre. Os cúmplices foram os fazendeiros, o governo Raupp (PMDB), a PM e o juiz de Colorado.
Folha - Por que você saiu do MST em 1992?
Cícero - Divergimos (risos). Temos mais de 40 mil famílias de sem-terra em Rondônia. Temos de trabalhar essas famílias e fazer ocupações em massa, já.
Folha - Por que agora?
Cícero - Depois da Santa Elina, estouraram ocupações. Isso mostra que, nesse momento, é uma necessidade dos sem-terra e não só de uma entidade.
Folha - O MST urbanizou seu discurso. Você concorda?
Cícero - Sim. Só que os sem-terra têm de ocupar terras.
Acho que nós temos de nos contrapor ao que o governo diz, de que "quem ocupa, não leva". É o contrário. Temos de fazer ocupações gigantescas e forçar os assentamentos.
Folha - Há vários grupos surgindo fora do MST. O MST e a CUT estão agindo errado?
Cícero - A CUT não. Nos apoiou desde o início. Precisamos dar respostas políticas às chamadas ocupações isoladas. A CUT entende isso. O MST precisa entender que há lutas que o movimento não está abarcando.
Folha - Você defende a resistência armada?
Cícero - Enquanto você pode resistir, você resiste. Acontece que lá nem pudemos negociar. O objetivo é a terra para trabalhar.
Estão falando aí de Sendero Luminoso. Se você falar de Sendero lá, vão pensar que é alguma coisa pra comer.
Folha - Você quer criar uma nova entidade nacional?
Cícero - Quem somos nós (ri)? O grupo da Santa Elina está disposto, por hora, dentro da luta de classes, a ocupar terras.
Folha - Então, vocês vão invadir outras fazendas?
Cícero - Se preciso, ocupamos todas as fazendas de Rondônia. Enquanto tiver uma família sem terra em Rondônia, estaremos na luta. Com ou sem MST, que deveria representar os sem-terra.
Folha - Você não tem medo de voltar a Corumbiara?
Cícero - Minha cabeça vale R$ 50 mil, a mando dos fazendeiros, mas não deixo uma luta pela metade. Quando o MST disse que nós éramos radicais, só incentivou a chacina e deu força aos fazendeiros.

Texto Anterior: Planejamento reduz a meta de assentamentos
Próximo Texto: Poucos vivem sem a ajuda do governo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.