São Paulo, domingo, 24 de setembro de 1995 |
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Anomia perturba os mercados globalizados
GILSON SCHWARTZ
Podemos definir hoje dois mercados de fato globalizados: o financeiro e o das comunicações. Mas tais mercados globais vêm passando por mudanças e abalos estruturais sem precedentes. São mercados que existem e têm uma concentração de poder inigualável, mas ao mesmo tempo parecem insubmissos e insubordináveis a qualquer lógica, regra, padrão ou norma globalizada. Parte da globalização, o que explica mesmo o grau tão elevado da globalização é a própria "desregulamentação". A desregulamentação e até a falta de regulamentação nos grandes circuitos do dinheiro, da informação e da comunicação estimulam a globalização. Mas a falta de regras globais significa que eles passam com frequência excessiva e intensidade incômoda por ondas de instabilidade e reacomodação estrutural. Nas telecomunicações, gigantes como a AT&T passam por desdobramentos. A empresa subdividiu-se em três, demitindo de cara mais de oito mil pessoas. Outro gigante, a ITT, promete trifurcar-se em breve. Nas comunicações, as grandes indústrias do entretenimento e da informação se reagrupam para conquistar o mundo. Na informática, o Windows/95 tenta impor-se como padrão. Mas, apesar da propaganda, a computação ainda não convergiu para um sistema operacional universal. A Oracle considera o modelo Microsoft fadado ao fracasso. Nas finanças, os mercados cambiais globais desafiam todas, repito, todas as teorias existentes sobre determinação das taxas de câmbio. Londres, Tóquio e Nova York negociam cerca de US$ 1 trilhão por dia sem que haja no sistema qualquer idéia minimamente consensual sobre como funcionam as taxas de câmbio. O dólar, em dois dias, desabou até 7% na semana passada. Para alguns, tudo tem origem no déficit comercial recorde na economia americana. Outros, no momento a maioria, acentuam a insuficiência do pacote de estímulo econômico (mais de US$ 130 bilhões) do governo japonês. Esperavam medidas firmes para sanear o sistema bancário japonês. Mas a coisa ficou mesmo feia quando as autoridades econômicas alemãs declararam a estabilidade dos seus juros e a inviabilidade da integração da economia italiana à União Européia. A corrida para o marco gerou uma reação em cadeia que jogou o dólar no chão também frente ao marco. EUA, Japão e Alemanha, nos últimos meses, vinham reduzindo as taxas de juros e levaram o dólar às alturas. O fato de seus bancos centrais transformarem-se agora em pivôs de situações problemáticas torna os mercados globais um pouco menos governáveis. É mais ou menos o que o sociólogo Durkheim queria dizer com o conceito de anomia. Em seu trabalho clássico sobre o suicídio, o genial francês dizia que a mobilidade, para cima ou para baixo, acaba produzindo mais malefícios que a estabilidade. A economia do século 20, no caso, confirma a sociologia do século 19. Texto Anterior: A Revolução da Propriedade e o mercado de capitais Próximo Texto: O jornalismo econômico Índice |
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