São Paulo, terça-feira, 26 de setembro de 1995
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Orçamento real chega a zerar verba social

MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O país tem dois Orçamentos. Um é a lei votada no Congresso que dá prioridade à Agricultura e determina que 1 milhão de famílias brasileiras deverão dispor, até o fim do ano, de serviços de saneamento básico. Outro Orçamento, o real, chega, em alguns casos, a zerar verbas sociais.
O Orçamento real nasce de um complicado sistema de liberação de verbas, comandado em dupla pelos ministérios do Planejamento e da Fazenda, onde a ordem é conter as despesas e chegar ao fim do ano sem rombo.
Na maré do "contigenciamento" de despesas -nome técnico do aperto nas contas-, alguns programas previstos na Lei do Orçamento não receberam nenhum tostão. Um exemplo é o projeto de geração de empregos e renda do Ministério do Trabalho, uma das cinco prioridades máximas da campanha de FHC.
No primeiro semestre, o projeto investiu exatos R$ 312 dos R$ 34,2 milhões previstos no Orçamento. Tão pouco que não saiu dos 0,00% nos registros do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira).
Acompanhadas por uma equipe de técnicos da Câmara, especialista em Orçamento, as liberações de dinheiro no primeiro semestre revelam o alto custo da máquina administrativa e até uma inversão de prioridades.
Um programa do Ministério da Fazenda para a assistência médica e dentária de seus funcionários gastou, nos primeiros seis meses do ano, 93,53% da verba prevista para o ano inteiro, de pouco mais de R$ 13 milhões.
No mesmo período, o programa de reforma agrária só teve liberados 2,97% de R$ 1 bilhão que a lei do Orçamento reserva para o assentamento e a manutenção de 200 mil famílias. O programa está na lista das prioridades para 1995.
A pesquisa feita no Siafi pela assessoria da Câmara não computou nesse percentual gastos com funcionários e a manutenção da máquina do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
No Ministério da Agricultura, o custo com o funcionalismo já consumiu 63% do que estava previsto para o ano todo só no primeiro semestre. Não é um caso isolado.
A situação se repete em quase todas as pastas e é um dos motivos apontados pelo governo para sacrificar muitos investimentos ou programas considerados prioritários. Primeiro, são pagas as dívidas da União, os salários do funcionalismo e as despesas do dia-a-dia dos ministérios. O resto fica com o que sobra disso.
No mesmo Ministério da Agricultura, as metas dos programas de controle de qualidade da produção agropecuária dificilmente serão cumpridas diante do ritmo lento de liberações.
O Ministério da Saúde é apontado pela equipe econômica como exemplo de onde o "aperto" é menor. Seria uma espécie de privilegiado. Mas o dinheiro é consumido quase todo com o pagamento de consultas e internações, funcionários e aposentados. Resultado: várias das prioridades listadas na área também deverão ficar no papel da lei orçamentária.
Atividades na área de infra-estrutura de saneamento básico, que deveriam atender 1 milhão de famílias, só gastaram, no primeiro semestre, 5,55% da verba prevista no Orçamento (R$ 31,1 milhões). Também seguiram devagar, quase parando, programas de abastecimento de água e esgoto.
Uma parte dos gastos com a merenda escolar pode ter sido feita por meio de uma operação financeira informal, sem o controle do Siafi, informou o secretário do Tesouro, Murilo Portugal.

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