São Paulo, terça-feira, 16 de janeiro de 1996
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Festa da uva

FERNANDO RODRIGUES

BRASÍLIA - É difícil não simpatizar com alguma decisão do governo que aparentemente favoreça os trabalhadores. Ontem, o ministro da Previdência, Reinhold Stephanes, foi obrigado a tomar várias decisões desse tipo.
A mais importante é que a Previdência para os trabalhadores da iniciativa privada vai ficar quase como é hoje. Depois de 35 anos (homens) ou 30 anos (mulheres) de contribuição será possível obter uma aposentadoria.
Antes, bastavam 30 ou 35 anos de trabalho. Agora, é necessário comprovar a contribuição.
Em uma reunião com sindicalistas Stephanes concordou em aceitar apenas a carteira de trabalho assinada como prova de contribuição à Previdência. Não é preciso elaborar muito para imaginar o manancial de fraudes que isso representa. Será uma verdadeira festa da uva.
Quem tiver uma carteira antiga pode procurar o nome de empresas que não existem mais e fazer um ou mais registros frios. "Claro que isso existe", diz Stephanes. "Mas sempre podemos verificar se a tinta é recente. Essa é uma forma de checar se o registro é falso ou verdadeiro", explica o ministro.
O argumento dos sindicalistas junto ao ministro foi simples: não pode ser do assalariado o ônus de provar que pagou suas contribuições à Previdência, desde que apresente uma carteira assinada. É justo.
Mas quem vai cobrir os buracos que serão criados por causa de eventuais fraudes? Todos os trabalhadores.
A Previdência está sendo informatizada e algum dia esse tipo de fraude será impossível. Mas isso é futuro.
Um ano depois de iniciada a discussão, a Previdência continua sem solução. Isso é ruim para quase todos.
A exceção são os 2 milhões de aposentados em regime especial. Eles consumiram R$ 35 bilhões com o recebimento de suas pensões no ano passado. Já os 15,7 milhões de aposentados comuns custaram apenas R$ 32,5 bilhões para o governo em 95.
Apesar das excelentes iniciativas de Stephanes, a reforma da Previdência é uma obra completamente inacabada. Será votada em uma semana e já tem prazo para revisão: dentro de cinco anos.
É um filme antigo. Basta lembrar da Constituição de 88. Aliás, a que engessou a Previdência da forma atual.

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