São Paulo, domingo, 21 de janeiro de 1996
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RÉPLICA

MARCELO LEITE

Recebi do diretor-adjunto da Publifolha, Ricardo Gandour, esta réplica à coluna da semana passada:
*
"Alguns profissionais têm um índice de produtividade associado ao seu trabalho. No último domingo, o índice do ombudsman parecia ser 'ataques à Folha por centímetro de coluna'.
"Marcelo Leite abordou um fato inquestionável -a tabela de distâncias do 'Mapa Rodoviário Fiat/Folha - Brasil', distribuída no último dia 7, contém erros, pelos quais devemos aos leitores desculpas e retificações. Mas, ao esticar o assunto, o ombudsman exagerou, e começou o ano maltratando a Folha.
"1) 'Omissão de cidades' - O elenco de cidades que aparecem em qualquer mapa é resultado da escala adotada e da legibilidade possível nesta escala. Gilly-lès-Cîteaux está no atlas rodoviário completo da editora Michelin e não está no mapa turístico dobrável, da mesma Michelin, apenas porque a escala não permite, e isso não desmerece aquele vilarejo, nem a editora.
"Em entrevista a Leite, por telefone, na sexta-feira (12), eu havia detalhado essa questão. Com a escala própria de um mapa rodoviário dobrável, disse-lhe, o mapa da Folha é um apoio ao colecionador dos fascículos, que aí encontra os roteiros selecionados pelo país.
"No texto do ombudsman, uma realidade da técnica cartográfica acabou figurando como algo enganoso para os leitores. Todos gostariam de ver sua cidade em qualquer mapa, até os moradores da charmosa Gilly-lès-Cîteaux! Em vez de esclarecer, Leite lançou à Folha uma culpa que ela não merece carregar.
"Considero um mapa turístico dobrável presente legítimo, e não 'de grego', como escreveu o ombudsman.
"2) 'Erro em distâncias' - Resultado de falha no processo de finalização, a tabela de distâncias contém 423 erros, ou cerca de 14% da tabela. Na mesma entrevista, relatei esses números ao ombudsman, que até então conhecia reclamações de quatro leitores.
"Em seu texto, o ombudsman tomou-me os números, e apresentou-os para reforçar seu poder de apontamento ('Na realidade, foram centenas, precisamente 423...', escreveu). Ao apropriar-se da minha fala e não me citar como fonte, o ombudsman maltratou a ética, aumentou um pouco mais sua produtividade e negou-me publicamente o mínimo de dignidade que um jornalista quer ter quando erra: a de apurar os seus próprios erros.
"Estamos planejando uma nova tabela, de mesmo formato, para ser colada sobre a que saiu com erros.
"3) 'Efeito paella' - No mais recente Fórum Folha de Jornalismo, Ángel Luis de la Calle, responsável pelas coleções distribuídas pelo diário espanhol 'El País', ponderou diversos aspectos sobre fascículos em jornais. Leite usou um deles para ilustrar sua 'tristeza' e atacar esse tipo de promoção, 'que tem os dias contados', segundo ele.
"Fascículos não tiram energia do jornalismo, como sugeriu Leite. Jornais de qualidade da Argentina, Espanha e Itália fazem fascículos e outras promoções há anos e uma coisa não tem nada a ver com a outra. Na Folha foi diferente apenas nos capítulos iniciais do atlas geográfico, quando se pinçou da Redação uma equipe (da qual o atual ombudsman fez parte) para a edição do livro.
"Depois, foi criado um setor para cuidar exclusivamente do assunto. Hoje, mais de 30 profissionais -entre redatores, designers, consultores, tradutores e revisores- estão envolvidos diretamente na produção de coleções para os jornais do grupo Folha e vários outros de todo o país. Uma operação autônoma, pois gera receitas atendendo o mercado, e independente das redações. Entrega, em capítulos e a domicílio, obras inéditas, úteis e em tiragem inimaginável em outra situação, que possibilita o acesso de milhões de leitores.
"O leitor quer receber um bom jornal. Se vier encartado com um fascículo de qualidade, tanto melhor. É com esse algo a mais que aquele grupo de profissionais trabalha, para dar um presente -legítimo- aos leitores."
*
Mesmo acusando-me de esticar o assunto, o diretor-adjunto da Publifolha gastou quase o mesmo espaço da coluna anterior para nada acrescentar.
Tome-se o exemplo da escala. Nada de novo há no argumento, em relação ao publicado, a não ser a menção estapafúrdia à localidade francesa.
Sua observação sobre ética também é dispensável. É óbvio que os dados foram fornecidos por ele, depois de apurados numa revisão que deveria ter sido feita antes de imprimir o mapa. Mas se faz questão do crédito dos 423 erros, dou-lhe de bom grado. E pergunto: a "dignidade" de "apurar seus próprios erros" teria sido trazida a público se o ombudsman não o tivesse entrevistado?
Quanto a fazer uma errata para ser colada sobre o mapa, acho uma boa idéia. Só que ela não foi mencionada na conversa da noite de sexta-feira.
Por fim, com respeito à drenagem de energia, que nega abstratamente, posso dar-lhe um exemplo concreto: o trabalho do ombudsman. Trata-se de uma função jornalística, voltada para a qualidade da informação. Ao longo de meu mandato, cerca de um terço do atendimento foi tomado por problemas causados pela introdução dos fascículos.
O diretor-adjunto parece contrariado, como se esperasse do ombudsman que não criticasse um produto estratégico para a Folha. Se era essa a expectativa, só me resta frustrá-la. Sou pago para defender os interesses do leitor e a qualidade da informação.

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