São Paulo, segunda-feira, 22 de janeiro de 1996
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Modernização é cosmética, mostra pesquisa

SILVANA QUAGLIO
DA REPORTAGEM LOCAL

A reestruturação da indústria no Brasil ainda é incipiente e as empresas, em geral, investem pouco na qualificação de seus empregados.
Essa é, em linhas gerais, a conclusão de uma pesquisa coordenada pelo professor Rogério Valle, do Programa de Engenharia de Produção da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O professor coletou questionários respondidos por 278 das maiores empresas nos 11 Estados com índice de industrialização mais representativa no país. As empresas pertencem a nove dos principais setores da indústria (como metalurgia, têxtil e alimentos).
Valle concluiu que, até agora, a idéia de qualidade total no Brasil tem apenas um "efeito cosmético". Já que a maior parte das reestruturações ainda não envolveu grandes investimentos.
E mais, as empresas privilegiam investimentos em máquinas e equipamentos, deixando o treinamento e a qualificação da mão-de-obra em segundo plano.
Uma das vilãs no cenário do mercado de trabalho brasileiro é a rotatividade da mão-de-obra.
Segundo Valle, a rotatividade gera insatisfação constante. As empresas não investem porque sabem que o trabalhador não vai ficar. O treinamento é, portanto, insuficiente.
O resultado é baixo índice de qualidade e produtividade. Para Valle, a conclusão é simples: "Rotatividade prejudica a formação de mão-de-obra qualificada."
"Estamos falando de treinamento profissional, de formação técnica e global, o que aumenta a cultura do trabalhador", completa.
Para o professor, num país como o Brasil que ainda precisa alfabetizar a população na linguagem natural (o português), treinamentos voltados exclusivamente para qualidade total não funcionam.
"Educação, no Brasil, é um falso consenso", diz Valle. "Todos dizem que é preciso investir, mas ninguém faz nada."
Valle ressalta que experiências como a do Senai, de escolas mantidas pela Indústria, são válidas, mas insuficientes e caras.
Alta flexibilidade
O principal motivo da rotatividade no mercado de trabalho nacional é a facilidade que se tem para demitir e para contratar mão-de-obra (flexibilidade).
O mercado norte-americano é o mais flexível do mundo, mas lá o trabalhador não é descartável como no Brasil, diz Valle.
A pesquisa de Valle será publicada em um livro organizado pelo professor José Márcio Camargo, do departamento de economia da PUC-RJ, pela editora da Fundação Getúlio Vargas. Deverá ser lançado até maio.
Para Camargo, a principal vantagem da flexibilidade é manter reduzida a taxa de desemprego -7% da força de trabalho, segundo o Dieese, e menos de 5%, segundo o IBGE. A maior desvantagem: incentiva a baixa qualificação.
Por isso, na opinião de Camargo, não se deve buscar a flexibilidade máxima nas relações de trabalho.
Melhorar o grau da qualificação da mão-de-obra é também, segundo Camargo, um passo para reverter a péssima distribuição de renda que existe no Brasil.
Em vez de "prêmio" ao desempregado, o FGTS deveria ser um pecúlio para complementar a renda na hora da aposentadoria.

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