São Paulo, segunda-feira, 22 de janeiro de 1996
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Arafat vence em eleição considerada 'limpa e livre'

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A JERUSALÉM

O mês mais sagrado do calendário muçulmano, o Ramadã, começou sábado como se fosse uma bênção especial para Iasser Arafat, líder histórico dos palestinos.
Primeiro, porque Arafat, 66, foi eleito, como se previa, presidente da ANP (Autoridade Nacional Palestina), com enorme folga (88,1% dos votos contra 9,3% para sua única adversária, Samiha Khalil, e 2,6% de brancos e nulos).
Segundo, e mais importante, porque a comunidade internacional deu certificado de aprovação para o processo eleitoral, em comunicado oficial emitido ontem pelos 650 observadores externos que o acompanharam.
Nos últimos anos, passou a ser norma não escrita que todo país transitando para a democracia deve receber da comunidade internacional o carimbo de justas e livres para suas eleições.
Os observadores das eleições palestinas não chegaram tão longe, mas suas ressalvas foram mínimas.
O comunicado diz: "As eleições, quando julgadas por padrões aceitáveis internacionalmente, e após pesar algumas deficiências que foram notadas no período de observação, podem ser razoavelmente consideradas como uma correta expressão do desejo dos votantes no dia da eleição".
Assinam delegados da União Européia, de 13 países como Japão e Suíça e de três organismos internacionais (Organização de Unidade Africana, Organização da Conferência Islâmica e Movimento dos Não-Alinhados).
O ex-presidente norte-americano Jimmy Carter, que chefiou outro grupo de observadores, selou com dois beijos em cada face de Arafat a sua avaliação de que "o resultado global foi excelente".
A mídia israelense trilhou idêntico caminho de elogios. Escreveu, por exemplo, o colunista Danny Rubinstein, do diário "Haaretz": "Foi uma bem-sucedida demonstração de democracia, embora democracia relativa".
O editorial do mais popular jornal do país, o "Yediot Ahronot", é menos reservado: "A paz ganhou, Arafat ganhou e a democracia ganhou".
Já o "Maariv" prefere uma comparação: "Paradoxalmente, os árabes têm mais de 20 Estados em que eleições livres não ocorrem e um lugar onde as eleições são mais ou menos democráticas, mas no qual não há um Estado", diz.
Mais ou menos na mesma linha, o colunista Zvi Barel, do "Haaretz", escreve que "Israel não é mais a única democracia no Oriente Médio".
Até o primeiro-ministro israelense, Shimon Peres (indicado ontem por seu Partido Trabalhista como candidato à reeleição), festejou o comparecimento como "uma maciça demonstração de suporte para o processo de paz".
É explicável: os grupos palestinos contrários ao processo de paz apostavam em um baixo comparecimento (em torno de 55%) como demonstração de razoável grau de rejeição aos acordos com Israel.
O que ocorreu (exceto em algumas cidades da região particularmente em estado de conflito) foi o contrário.
"Foi uma grande vitória para os moderados", diz o rabino Henry Sobel, da Congregação Israelita Paulista, que amanhã entrega a Arafat, em Gaza, uma escultura chamada "A Pomba da Paz".
"Uma tremenda derrota para o Hamas", prefere Manuel Marín, o espanhol que é um dos dois vice-presidentes da União Européia.
O Hamas (Movimento de Resistência Islâmica) era contra a eleição, embora seus apelos ao boicote tivessem sido moderados.
Agora, vem talvez o mais difícil, a negociação entre Israel e palestinos para estabelecer o status definitivo de Jerusalém Oriental (reivindicada como capital pelos palestinos), das colônias israelenses nos territórios palestinos e a situação dos refugiados (só no Líbano, são 350 mil).
Será o momento de se comprovar ou não a avaliação que fez ontem em entrevista à Folha Carl Lidbom, ex-ministro sueco da Justiça e chefe dos observadores da União Européia:
"Depois de três meses aqui, é fácil ver que a paz começa a chegar a esta região."

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