São Paulo, domingo, 20 de outubro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Hipertensão causa "guerra química"

RICARDO BONALUME NETO
ENVIADO ESPECIAL A MONTRÉAL

Um estudo realizado na China demonstrou pela primeira vez que o uso de um medicamento, a nifedipina, diminuiu em 2,3 vezes o risco de acidentes cardiovasculares (derrames) e em 6,8 vezes o risco de arritmias cardíacas em pacientes idosos (de 60 a 79 anos) e hipertensos.
A pressão do sangue é aquela exercida por esse líquido nas paredes das artérias. A hipertensão, ou pressão sanguínea alta, é um problema que afeta milhões de pessoas em todo o mundo; no Brasil, estima-se que 10% dos adultos sejam hipertensos.
O estudo chinês foi "controlado". Isto é, 891 pacientes eram tratados com o medicamento, e outros 741 recebiam algo inócuo, um "placebo" (por isso ficaram de fora do estudo hipertensos graves).
Os novos resultados do estudo Stone (sigla em inglês para "estudo da nifedipina em idosos em Xangai") representam uma batalha ganha em uma guerra "química" bilionária.
A disputa começou quando vários estudos recentes sugeriram que essa droga, e outras semelhantes, as "antagonistas de cálcio", não só podiam causar mortes de pacientes por problemas cardiovasculares, como também matar alguns deles de câncer.
O principal autor da polêmica foi o pesquisador Curt Furberg, da Escola de Medicina Bowman Gray (EUA). Ele e dois colegas escreveram que "em pacientes com doença coronária, o uso de nifedipina de ação curta em doses de moderadas a altas causa um aumento na mortalidade total".
Outro estudo, feito de 88 a 92 por pesquisadores dos EUA e Itália, mostrou uma risco 1,72 vez maior de câncer com o uso desses bloqueadores de canal de cálcio em pacientes idosos.
No debate entre médicos, que transbordou para a imprensa, não faltaram insinuações sobre "a influência de companhias farmacêuticas nos argumentos e motivos dos pesquisadores", como declarou em editorial a revista médica "Journal of Hypertension".
O novo estudo foi divulgado em uma coletiva de imprensa em Montréal, Canadá, pelos seus principais autores, Lansheng Gong, do Instituto de Hipertensão de Xangai (China), e Jacques Le Lorier e Pavel Hamet, da Universidade de Montréal (Canadá).
"Nós agora provamos para esse medicamento a existência de benefícios, uma diminuição significativa no número de eventos terminais", disse Hamet ("evento terminal" quer dizer "morte").
O objetivo principal do estudo era testar o efeito cardiovascular, mas, diz ele, "houve uma diminuição biologicamente interessante das mortes por câncer".
Existem diversos tipos de drogas para combater a hipertensão, todas com grande mercado potencial. No Brasil, o mercado de anti-hipertensivos mais do que dobrou de 1992 a 1996. Dados de agosto passado indicam vendas de US$ 196 milhões dos cinco principais medicamentos.
Diferentes estilos de vida e hábitos alimentares causam grandes diferenças na incidência de hipertensão entre os países. Em casos menos graves, o uso de medicamento pode não ser necessário, bastando por exemplo mudanças na dieta -uso de menos sal.
A hipertensão pode causar danos em vários órgãos; 50% dos pacientes morrem de doença do coração, 33% morrem de derrame.

O jornalista Ricardo Bonalume Neto viajou a Montréal a convite da Bayer

Texto Anterior: Pesquisadores apostam em corações frios para salvar vidas
Próximo Texto: Novas drogas anti-Aids causam otimismo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.