São Paulo, domingo, 27 de outubro de 1996 |
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Crônica de um déficit anunciado
CELSO PINTO A razão para o nervosismo do mercado com a balança comercial, reforçado sexta-feira, não vem dos déficits em si, que têm seguido uma trajetória de piora lógica e previsível, mas da forte deterioração nas últimas três semanas. E da perda de credibilidade das explicações oficiais.Dois grandes bancos estão projetando um déficit comercial de US$ 1,2 bilhão este mês, e já existe uma previsão de déficit de US$ 5 bilhões para o ano. Se for confirmado, o nervosismo vai aumentar muito mais. Brasília diz que é um susto temporário de fim de ano. O mercado, no entanto, está cético com os argumentos do governo. No final de julho, um economista do Ministério da Fazenda me disse que havia feito alguns testes de sensibilidade das exportações e importações em relação à taxa de câmbio, ao nível de crescimento da economia e à abertura externa. Descobriu o óbvio: que câmbio sobrevalorizado, aceleração da economia e abertura provocam redução das exportações e aumento das importações. A Fazenda, contudo, sempre ofereceu explicações oficiais muito menos óbvias. Quando os números entraram no vermelho, em junho, culpou-se a "obsessão da imprensa", que, sem conseguir mais más notícias mensais sobre a inflação, passou a torcer por más notícias mensais sobre a balança e a extrapolá-las indevidamente. Em julho, novo déficit. Dessa vez, além da má vontade da imprensa, a culpa foi da greve nos portos de Santos e Paranaguá, que atrasaram os embarques de soja. O que não embarcou em julho, portanto, deveria ter sido embarcado em agosto. Veio agosto e a soja não salvou a balança. Como não houve greve, dessa vez a culpa foi do atraso nas exportações com a expectativa de aprovação da isenção do ICMS sobre exportações. Em setembro, novo déficit desastroso e outra explicação pontual. Dessa vez, além do projeto do ICMS, houve a importação extra de US$ 200 milhões de petróleo e uma mudança na contabilidade das exportações, que acabou reduzindo em cerca de US$ 120 milhões o embarque do último dia útil do mês. O déficit, portanto, foi artificialmente inchado. Veio outubro e, de fato, a média de exportações diárias nos três primeiros dias úteis subiu para US$ 219 milhões, comparada à média de US$ 196 milhões em setembro. Na segunda semana, contudo, a média caiu para US$ 189 milhões e na terceira despencou para US$ 169 milhões. O susto exigiu uma explicação de emergência: outra greve no porto de Santos (que responde por apenas 25% dos embarques). O detalhe é que, aparentemente, a média caiu ainda mais depois do final da greve. Aliás, as greves nos portos parecem ter uma característica curiosa. Os grevistas, pelo visto, se recusam apenas a embarcar exportações, não a desembarcar importações. As indicações são de que as importações têm subido ainda mais neste mês. Outro péssimo sinal é o comportamento das contratações de câmbio para exportações e importações (que se transformarão em embarques futuros). Apesar dos déficits crescentes na balança física desde junho, continuou a haver superávits no fechamento de câmbio. Não mais. Até quinta-feira, o câmbio neste mês acumulou um déficit de US$ 241 milhões. Como, em média, 30% das importações não passam por esse mercado de câmbio, o déficit indica uma tendência muito negativa para os próximos meses. Não havia déficit nesse tipo de câmbio desde dezembro de 94. Os últimos resultados, projetados para o futuro, dão números desastrosos. É preciso, contudo, esperar as próximas semanas para confirmar a tendência. E para descobrir que desculpas virão de Brasília desta vez. Processo contra Olacyr Pelo menos um fundo internacional, administrado por um banco brasileiro, que tinha uma fatia dos US$ 13 milhões em "commercial papers" não honrados pela Constran, do grupo Olacyr de Moraes, decidiu ir à luta. Esse banco vai processar tanto a Constran quanto Olacyr, já que ambos são avalistas do papel. Está decidindo apenas em que foro será melhor abrir a ação: no Brasil ou na Inglaterra. Texto Anterior: Campo do atraso Próximo Texto: Ministério Público apura morte de bebês Índice |
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