São Paulo, domingo, 27 de outubro de 1996
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Crianças deixam escolas para trabalhar

ARI CIPOLA

ARI CIPOLA; DANIELA FALCÃO
DA AGÊNCIA FOLHA

Menores de 14 anos vivem drama no Brasil, que não cumpre determinações contrárias ao trabalho precoce

DANIELA FALCÃO
Cerca de 8,8 milhões de crianças e adolescentes, entre 5 e 17 anos, trabalham no país.
Dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar) de 95 indicam que o número de crianças entre 5 e 14 anos que trabalham chega a 3,8 milhões (veja quadro na pág. ao lado).
Essa realidade contraria artigos do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e Convenção 138 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que vetam trabalho para menores de 14 anos.
O campo abriga a maioria dos trabalhadores. Mais da metade das crianças entre 10 e 14 anos que trabalham estão na agricultura.
São Paulo é o único Estado do país em que a maioria dos trabalhadores entre 5 e 9 anos não vive de atividades agrícolas.
Boa parte das crianças que trabalham no Brasil não é remunerada (54,7%). Os trabalhadores mirins recebem em média 20% do salário mínimo por mês (R$ 22,40). No Nordeste, o rendimento médio mensal das crianças é ainda menor: cerca de R$ 11,00.
Um dos aspectos mais negativos do trabalho infanto-juvenil é o abandono da escola.
Como são submetidos a longas jornadas -31% das crianças entre 10 e 14 anos trabalham mais de 40 horas por semana-, boa parte delas não consegue conciliar estudo e emprego.
Apenas 2 em cada 3 crianças nordestinas têm como atividade exclusiva os estudos e 12,7% só trabalham. No Sudeste, 6,6% trabalham em vez de estudar.
Em três dias de viagem pelas cidades de Araripina, Ouricuri, Ipubi e Trindade, todas na região denominada de "Sertão do Araripe", no oeste pernambucano, a reportagem da Agência Folha encontrou crianças trabalhando pela sobrevivência e à margem dos direitos internacionais, entre eles, o de estudar e brincar.
Parte dos meninos não foi sequer contada ou identificada oficialmente pelo governo. Um em cada três não tem nem mesmo registro de nascimento.
A região do Araripe é o principal pólo de desenvolvimento do sertão brasileiro, onde o governo federal financiou R$ 100 milhões para investimentos industriais.
O Araripe produz 95% do gesso consumido no Brasil.
"Nos números, a região é o céu. Mas a barbárie equivale à da Europa antes da revolução industrial", afirma Salomão Jacó, secretário de Saúde de Araripina e único perito médico da Justiça do Trabalho da região.

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