São Paulo, domingo, 3 de novembro de 1996
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Quem planeja São Paulo?

EDUARDO DELLA MANNA

Frequentemente alguns segmentos da sociedade acusam os empresários do setor imobiliário de fazer pressões no sentido de alterações no zoneamento de ruas ou de perímetros da cidade de São Paulo.
A visão apresentada é a de que o empreendedor, movido por interesses próprios e especulativos, desenvolvendo junto ao legislativo municipal projetos de lei que modifiquem características de ocupação, e possibilitando, assim, maior permissividade em relação às leis de uso e ocupação do solo vigentes, conquista benefícios em detrimento da qualidade de vida do conjunto da sociedade.
Essa colocação é descabida. A maioria dos projetos de lei em tramitação na Câmara Municipal solicitando alterações no zoneamento diz respeito à transformação de ruas em bairros de uso estritamente residencial, as chamadas Z1, em corredores de uso especial, onde seriam permitidas algumas atividades de serviços ou comércio.
As audiências públicas na Câmara têm demonstrado que a demanda por alterações tem partido dos próprios moradores que, repentinamente, se vêem diante do completo desvirtuamento de locais que, antes, apresentavam características bem diversas das atuais.
É o caso, por exemplo, das ruas Canadá e Groenlândia e alameda Gabriel Monteiro da Silva, nos Jardins; avenidas São Gualter e Professor Fonseca Rodrigues, no Alto de Pinheiros; ruas Amália de Noronha e Ásia, no Jardim das Bandeiras; avenida Professor Ascendino Reis e alameda dos Nhambiquaras, em Indianópolis; avenidas Valentim Gentil e Waldemar Ferreira, no Butantã; e avenida Jorge João Saad, no Morumbi.
Se isso é positivo ou negativo, do ponto de vista urbanístico, não nos cabe julgar. Além de solicitações perfeitamente legítimas e justificáveis, são reflexo da dinâmica própria de uma grande metrópole como a nossa, incapaz de ser contida em seu crescimento e carente de mecanismos permanentes de reavaliação e redirecionamento.
Curioso é percebermos que, na realidade, o que tem mudado o perfil de ruas ou até mesmo de regiões inteiras da cidade são as alterações promovidas pelos agentes da Secretaria Municipal de Transportes, como CET e DSV.
As modificações nos sentidos de direção de tráfego ou a busca por novos canais de fluxo viário causam a invasão desses outrora pacatos bairros residenciais, colocando-os, repentinamente, como instrumentos de rotas alternativas e transformando-os em verdadeiros corredores de tráfego intenso.
Já é hora de o poder público municipal encarar de maneira correta os terríveis problemas urbanos da cidade de São Paulo. As soluções devem ser concebidas de forma integrada, para que a cidade cresça de modo planejado, e não à mercê de soluções setorizadas.
As secretarias municipais deverão estabelecer políticas de atuação conjunta que satisfaçam as necessidades de crescimento da cidade e ao mesmo tempo persigam a manutenção da qualidade de vida.
Caso contrário, continuaremos vendo a Secretaria Municipal de Transportes exercer o papel do verdadeiro agente responsável pela demanda por alterações no zoneamento da cidade de São Paulo.

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