São Paulo, domingo, 3 de novembro de 1996
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Maus perdedores

EPITÁCIO CAFETEIRA

Dois panfletos políticos contra a candidatura de Celso Pitta, e por consequência em favor de sua adversária, publicados na Folha pelos professores Paulo Sérgio Pinheiro (27/10) e Lúcio Kowarick (30/10), simulando análises sociológicas, não chegam a esconder o caráter autoritário de uma esquerda que não sabe perder.
Como todo mau perdedor, seja no futebol ou na política, Paulo Sérgio Pinheiro brada em tom raivoso contra o juiz -no caso, o TSE, que autorizou um direito de resposta a Pitta depois de findo o horário eleitoral gratuito-, reclama da chuva e principalmente do público, essa galera de "eleitores encharcados", "excitadíssimos para sufragar Pitta".
Em seguida, xinga e tenta desqualificar de todos os modos o técnico e os atletas do time rival. Maluf e Pitta são o novo "populismo de direita". Maluf fez plástica, corrigiu a voz etc. etc. etc. Pitta é "simulacro", "contador", "artefato" e "sinistro". Ambos conseguem êxito, como o dobro dos votos no primeiro turno sobre a candidata do PT, apenas por causa da "varinha de condão-propaganda política", que faz o eleitor votar "como quem compra um xampu".
Como todo torcedor fanático ou político fundamentalista, o professor Pinheiro não consegue enxergar em seus desafetos nenhuma qualidade que possa ajudar a explicar a preferência maciça do eleitorado.
Ele nem sequer coloca na balança uma dúvida que a lógica e a prudência recomendariam: se os vencedores são assim tão ruins, como serão os perdedores? Não, ele vê seu time perder pelo dobro dos gols obtidos pelo adversário e só encontra uma explicação: esse povinho molhado, burro e ignorante, deixa-se levar pela "publicidade virtual" do "Fura-Fila" e do Cingapura, não entende nada de política, não sabe votar e, pelo ponto de vista do professor, não sabe nem sequer escolher xampu.
Sim, porque ninguém pode negar que marketing e publicidade virtual foram usados por todos os candidatos. Dona Erundina catava gravetos no parque, para que os eleitores esquecessem que, quando assumiu a Prefeitura de São Paulo, ainda pregava a luta armada.
O PT, quando foi governo, usou e abusou do marketing. Jack Palance aparecia na TV com seu bordão -"Acredite se quiser"- para que a população se esquecesse do empreguismo e da corrupção na CMTC, do escândalo Lubeca e do caso Shell na reforma de Interlagos, pelo qual a ex-prefeita ainda está sendo processada.
Já o artigo de Lúcio Kowarick, sem dispensar os xingamentos (Pitta é "sombra e ventríloquo de Maluf"), apela feio, citando fora do contexto palavras de 23 anos atrás do sociólogo Fernando Henrique Cardoso, na tentativa de criar constrangimentos para o atual presidente da República, cujo ministro da Coordenação Política, Luiz Carlos Santos, já anunciou, devidamente autorizado pelo chefe do governo, o apoio ao candidato do PPB no segundo turno da eleição paulistana.
A lição desta eleição, que intelectuais burocratas não querem ter a humildade de assimilar, é que o povo não está interessado em populismo de esquerda e direita ou em coletivismo de cima ou de baixo. Quer saber quem adotou políticas concretas em seu benefício e quais as propostas para educação, saúde, habitação, transporte etc.
Nenhum marketing pode derrubar um governo eficiente e uma proposta boa, como demonstraram os resultados de Porto Alegre, Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro, onde triunfaram partidos tão diferentes como PT, PSDB, PPB e PFL, respectivamente.
A diferença básica entre Paulo Maluf e o PT, quer em São Paulo, quer a nível nacional, é que o prefeito de São Paulo lidera um grupo político coeso, que tem um projeto nacional definido e sabe governar cidades ou Estados para além das divergências internas.
Já o PT é o maior adversário do PT, como provam a campanha pelo voto nulo no segundo turno no Rio e as críticas da direção nacional petista às medidas de racionalização administrativa do governador capixaba, Vitor Buaiz.
O time de Maluf tem bom técnico, joga unido, tem a maior torcida e está vencendo de goleada. Já o time do PT ainda não chegou a um acordo sobre a bola, se é redonda ou quadrada.
Resumindo, a escolha dos que devam representar o povo é feita pelo voto da maioria do povo e não em análises sociológicas dos que se julgam iluminados e salvadores da pátria, do tipo Sassá Mutema.

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