São Paulo, sexta-feira, 15 de novembro de 1996
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Divisão interna do PT reduz chances de Erundina comandar SP pela 2ª vez

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Há oito anos, também em 15 de novembro, Luiza Erundina acordou um tanto ansiosa e tomou o café da manhã cercada por cinco amigos petistas.
Todos dividiam com ela a impressão de que o crescimento de sua candidatura, nos três dias anteriores, poderia levá-la à Prefeitura de São Paulo. Foi o que ocorreu.
A ansiedade por certo não será hoje a mesma no apartamento de dois quartos e 90 metros quadrados em que a candidata do PT mora, sozinha, na rua dos Heliotrópios, Saúde, zona sul. As pesquisas de intenção de voto lhe dão desta vez a segunda colocação.
Entre a vitória de 1988 e a desesperança de hoje, Luiza Erundina de Sousa, 61, exercitou frequentemente sua reputação de mulher de briga, capaz de sorrir ou de esbravejar com o dedo em riste.
Quase rompeu com o PT ao se tornar por três meses, em 1993, ministra-chefe da Secretaria da Administração no governo Itamar Franco. Teve sua filiação partidária suspensa.
Concorreu no ano seguinte ao Senado. As pesquisas a deram por meses como praticamente eleita para uma das duas cadeiras de São Paulo. Mas naufragou porque, em obediência a seu partido, atacou o Plano Real como inconsistente.
Brigou novamente, dentro do PT, para se candidatar neste ano à prefeitura. Os cardeais do petismo -a começar do próprio Lula- queriam a candidatura de Aloizio Mercadante. Erundina o derrotou, em maio, em prévia interna, por 5.073 a 3.355 votos. Depois, transformou-o em seu vice.
Foi a segunda vez em que impôs uma derrota aos dirigentes petistas. Em 1988, o derrotado foi o então deputado federal Plinio de Arruda Sampaio. "Eu tenho a cara do PT, a cara do povo", disse ela no início da atual campanha.
Mas há uma simbologia de conteúdo disparatado no petismo de Luiza Erundina. Acreditava ser inevitável a luta armada para se chegar ao socialismo, mencionava o "poder popular" como estrutura paralela às instituições, quis desapropriar todas as empresas de ônibus e transformar o casarão dos Matarazzo, na avenida Paulista, em Museu do Trabalhador.
"Sim, fui xiita , quando era necessário ser xiita, no momento da luta contra o arbítrio. Hoje as coisas mudaram", disse ela, em março deste ano.
No Executivo, ao comando do terceiro orçamento brasileiro, conseguiu "temperar a radicalidade". Enfrentou cinco greves de servidores comandadas por petistas. Sofreu uma marcação cerrada do TCM (Tribunal de Contas do Município) e do diretório municipal de seu partido, sem que ficasse clara a relação entre políticas públicas e propostas partidárias.
O saldo, de qualquer modo, foi a ênfase do social e uma paralela hipertrofia das obras viárias. Ela não legou túneis e viadutos e, com isso, perdeu em visibilidade.
Nascida em Uiraúna, sertão da Paraíba, sétima de uma família de dez filhos, assistente social pós-graduada em São Paulo, Luiza Erundina elegeu-se vereadora em 1982 e deputada estadual em 1986.
Continua sendo uma mulher de hábitos simples. Prepara seu café da manhã, repassa roupas que se amassaram no armário, não usa carro do ano e despreza pratos sofisticados pela comida nordestina.
Antes de seu início, a atual campanha pela prefeitura trazia uma Luiza Erundina na liderança das intenções de voto e com uma multiplicidade de adversários para atingir. Francisco Rossi (PDT) era quem a ameaçava mais de perto.
Mas ela não contava com o projeto malufista de fazer crescer a candidatura de Celso Pitta (PPB) com base na erosão de seu próprio capital de intenções de voto nem com a agressividade quase truculenta com que José Serra (PSDB) procurou fazer o mesmo.
A esse roteiro se somou o ingrediente habitual das disputas internas do PT. Lula em nenhum momento se engajou de corpo e alma na campanha de Erundina. O partido abriu fogo contra os publicitários que de início supostamente despolitizavam sua imagem.
O fato é que, com o PT dividido e desmotivado, a campanha não demonstrou seu esperado fôlego. Mesmo assim, saiu incólume a imagem de uma Erundina militante, briguenta, que, disciplinada, cumpriu sua tarefa.

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