São Paulo, sexta-feira, 15 de novembro de 1996
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Grupo Dança Burra faz denúncia política

ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O mineiro Marcelo Gabriel, fundador do grupo Dança Burra, é uma das atrações do Festival Internacional de Dança (FID), que começa dia 19, em Belo Horizonte, e dia 26, em São Paulo, no Sesc Ipiranga.
Aos 25 anos, Gabriel se destaca na nova geração de coreógrafos brasileiros pela denúncia social e política de sua dança.
"O Nervo da Flor de Aço", que ele vai apresentar no FID (dias 23 e 25, em Belo Horizonte, e 28 e 29, em São Paulo) fala da usurpação do poder atual, utilizando como gancho o golpe militar de 1964.
"O golpe é um assunto que me ronda, pois o fascismo subterrâneo nunca acabou no Brasil, principalmente agora, quando tudo é permitido e nada é permitido ao mesmo tempo", afirma Marcelo Gabriel.
Dizendo-se assustado com a falta de posicionamento dos jovens, ele enfatiza que sua geração é muito manipulada e massificada.
"Essa constante festa de carnaval que nunca termina no Brasil é muito estranha. Acho falsa essa imagem de alegria porque, na verdade, a essência do povo brasileiro não é discutida. Mais do que nunca, estamos sofrendo uma miséria física e espiritual completa", ataca.
Abstracionismos
Disposto a contrariar a regra, Gabriel não quer cair em abstracionismos. "A dança está viciada em criar belos efeitos. Em vez de abstrações estéticas, quero discutir questões reais, mais urgentes e contundentes."
Ex-estudante de dança clássica na escola do Grupo Corpo de Belo Horizonte, Gabriel também fez aulas de flamenco, butô, dança moderna e ginástica olímpica.
"Gosto do intercâmbio de linguagens, por isso também uso vídeos e projeções de slides em meus espetáculos", explica.
Sobre "O Nervo da Flor de Aço", Gabriel diz se tratar de um musical anti-Broadway, ao som de músicas que ele compôs junto com Laura Finocchiaro e Adriano Cintra.
"Procuro romper com os aspectos formais da estrutura artística convencional. Fujo de clichês e da narrativa, descarto cenários, figurinos e efeitos de luzes. O que mais valorizo é o performer em si", diz.
"Entro em cena com roupas normais, que uso no dia-a-dia, pois acho que é mais uma forma de criar intimidade com o público e de me aproximar da realidade cotidiana", completa.
Dança Burra
Gabriel tinha 16 anos quando fundou o grupo Dança Burra. O nome da companhia, que hoje se reduz a ele mesmo, tinha como intenção resistir à inteligência formal do meio artístico em geral. "Queria expressar coisas mais espontâneas", justifica.
Em um de seus espetáculos, "Estábulo de Luxo", dançado junto com a bailarina Adriana Banana, chegava a perfurar os lábios em cena, para protestar contra a epidemia de Aids.
No momento, Gabriel está treinando um grupo, do qual ele não cobra pressa para subir ao palco. "Gosto de dar liberdade, estrearemos quando eles se sentirem prontos."
Segundo Marcelo Gabriel, sua próxima investida será subverter "O Lago dos Cisnes", um dos ícones do balé clássico, cuja versão pessoal ele pretende estrear no próximo ano.
Mês passado, ele realizou uma performance na exposição promovida pelo projeto "Antarctica Artes com a Folha".
"Quero criar alternativas para um público jovem, que não tem hábito de ir ao teatro", afirma Gabriel.

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