São Paulo, sexta-feira, 15 de novembro de 1996
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Pintou sujeira

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Longos anos de uma inflação indecente acostumaram o brasileiro a transformar em cabalísticos certos números. Antes, era o da inflação. Lembra-se do tempo em que uma lei não escrita dizia que, sempre que a inflação mensal batesse em 15%, viria um choque econômico?
Bom, agora, o número mágico é o da balança comercial, antes quase um esoterismo. Com a crise mexicana do final de 1994, virou lei, também não escrita, que países com déficits elevados na balança comercial estão condenados ao inferno da desestabilização.
Pois bem: ontem, o governo anunciou um baita déficit comercial em outubro, com as importações superando as exportações em US$ 1,3 bilhão. Já é um número imponente, para um único mês.
Mas torna-se ainda mais infernal quando se considera que, nas previsões mais pessimistas, o déficit de outubro apenas roçaria US$ 1 bilhão.
Atingir um número 30% maior do que uma previsão já pessimista equivale, em linguagem popular, a pintar sujeira.
Ou, em termos mais elegantes, dá razão por inteiro à avaliação que a CNI (Confederação Nacional da Indústria) fez no informe conjuntural relativo a outubro, anterior portanto ao número cabalístico.
"A rapidez e intensidade com que está ocorrendo a deterioração da balança comercial neste último trimestre do ano causaram surpresa e impõem a necessidade de avaliar os rumos da política econômica e seus reflexos sobre a estabilização", dizia a CNI.
Se era essa a avaliação antes do US$ 1,3 bilhão, agora a CNI, bem como a maior parte do empresariado, vai gritar ainda mais alto o que já dizia antes: "A solução para este quadro está longe de ser trivial e certamente não passa por soluções simplistas do tipo condenar a economia à estagnação".
O problema vai ser combinar a tática com o governo federal. A tendência deste é, mesmo, o simplismo de pôr o pé no freio da economia.

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