São Paulo, domingo, 24 de novembro de 1996
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Liberal critica o fetiche pelo dinheiro

FERNANDO DE BARROS E SILVA
DO ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Eduardo Giannetti da Fonseca, o mais liberal dos intelectuais presentes ao seminário "A Globalização, o Estado e o Indivíduo", promovido pela Souza Cruz, desconcertou o público ao final de sua palestra, quando definiu como uma "uma aberração quase inexplicável a preponderância do valor econômico na conduta humana".
Extrapolando a análise econômica para ingressar no terreno movediço da especulação filosófica, Giannetti disse que "a partir de certo nível de renda, ter tempo livre deveria ser muito mais importante e, no entanto, as pessoas continuam obstinadamente ocupadas em ganhar mais dinheiro".
Não acho, prosseguiu o economista, "que esse fetiche pelo dinheiro seja uma conspiração neoliberal. Isso talvez se explique por meio da psicologia profunda".
Giannetti chegou a dizer que "se os pobres rissem da riqueza dos ricos, ela talvez se esvaziasse, mas o problema é que os pobres a invejam". E concluiu sua fala de forma poética, citando Dorival Caymmi: "pobre de quem acredita na glória e no dinheiro para ser feliz".
Embora não tenha citado, a fala de Giannetti fez eco ao romance mais famoso de Aldous Huxley, "Contraponto" (1926), quando o personagem central, Philip Quarles, escreve que "o instinto aquisitivo comporta mais perversões do que o instinto sexual. As pessoas me parecem mais estranhas em questões de dinheiro do que mesmo em questões de amor. Que parcimônias espantosas não se encontram constantemente, sobretudo nos ricos".
A fala de Giannetti também fez lembrar o filósofo Blaise Pascal (1623-1662), em seus "Pensamentos", quando especula sobre a incapacidade dos homens de ficar em repouso, sem fazer nada.
Os homens, diz Pascal, se consomem "com encargos e negócios que os atormentam desde que desponta o dia. Eis aí uma estranha maneira de fazê-los felizes". Essa agitação humana, diz Pascal, se explica por uma razão profunda: "a infelicidade natural da nossa condição fraca e mortal, tão miserável que nada pode nos consolar, quando nela pensamos de perto".

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