São Paulo, domingo, 8 de dezembro de 1996
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De olho no lugar de Deus

VALDO CRUZ

Brasília - Cena ocorrida na última sexta-feira, durante a viagem do presidente Fernando Henrique Cardoso a Goiás, terra do deputado Pedrinho Abrão. Aquele que se envolveu no mais novo escândalo da Comissão do Orçamento.
Um líder local se aproxima de um deputado federal. Procurando ser discreto, faz um pedido em tom de súplica. "Eu já pedi ajuda até a Deus para liberar aquela verba, mas ainda não consegui. Você não pode me ajudar?"
O deputado, no meio da comitiva presidencial, saiu com essa: "Se Deus não te ajudou, quem sou eu. E se eu resolver, Deus vai pensar que estou de olho no lugar dele". E nem olhou para trás.
Não fosse a revelação de que um deputado tentou cobrar comissão de uma empreiteira, o desfecho natural para o diálogo seria, no mínimo, a promessa de que brigaria pela liberação do dinheiro.
O episódio de Goiás é contado por um governista para mostrar que o novo escândalo pode acabar ajudando o governo, reduzindo as pressões fisiológicas exatamente quando se aproxima a votação da emenda da reeleição.
Ainda mais sendo o personagem principal da denúncia um deputado do PTB. O partido é visto em Brasília como o mais fisiológico de todos. Com exceções, boa parte dos seus integrantes se move à custa de cargos e verbas.
Nos últimos dias, Pedrinho Abrão não fazia outra coisa senão ameaçar pular para o barco malufista, colocando o seu PTB na oposição.
A frase favorita do deputado, segundo aliados de FHC, era a seguinte: "Tudo o que eu defendo vocês negam. O Maluf nos trata superbem".
Agora, resta saber se o presidente consegue convencer os deputados indecisos só na conversa. Esse grupo enxerga na reeleição a chance de dar a grande mordida no governo tucano.
O mais provável é que o preço da reeleição não fique tão alto como o governo imaginava. De graça, porém, não vai sair. A turma da chantagem perdeu força, mas os profissionais vão continuar agindo.

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