São Paulo, quarta-feira, 14 de fevereiro de 1996 |
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"O Quatrilho" reproduz valores "globais"
SÉRGIO AUGUSTO
Quando foi ao ar, a minissérie "Memorial da Maria Moura" suscitou por todo canto a seguinte cobrança: "Por que o cinema brasileiro não consegue fazer uma coisa assim?". Ou seja, um filme artesanalmente impecável e dramaticamente convincente, à altura dos melhores importados. Para a maioria dos espectadores, "O Quatrilho" provou que isso é possível. Possível é, mas, antes de Fábio Barreto, pelo menos um cineasta da terra, por coincidência também bancado pela família Barreto, o Walter Lima Jr. de "Inocência", já provara ser possível ultrapassar os limites conceituais, dramatúrgicos e visuais impostos pelo "padrão Globo de qualidade". Ir além desse padrão, com os préstimos da inteligência, da ousadia e da sensibilidade, deveria ser uma obsessão do cinema brasileiro, que uma vez mais se crê renascente e só tem a lucrar se conseguir vender produtos diferenciados a quem aparentemente se satisfaz com o imaginário nacional veiculado de graça pela TV. O hábil e diligente Fábio Barreto -que nas cenas de festa e bodas demonstra ter aprendido algumas lições básicas de Coppola e Bertolucci- não pretendia dar esse salto. Optou pelo que talvez seja, na atual conjuntura e para um empreendimento financiado por 30 pessoas jurídicas, a estratégia correta: reacostumar as massas ao hábito de ver filmes brasileiros, oferecendo-lhes um sucedâneo com predicados palpáveis, de resto protagonizado por celebridades televisivas. Pena que a trama de "O Quatrilho", extraída de um romance de José Clemente Pozenato, seja demasiado frugal, deficiência nada desprezível em se tratando de um filme convencional de ponta a ponta. Na metragem a que afinal se ateve, sacrificando nuanças e passagens de tempo, "O Quatrilho" acabou virando um drama não apenas desprovido de conflitos (nada de realmente grave acontece aos seus personagens, todos os atritos se resolvem da melhor maneira possível) mas também ligeiro na abordagem das várias questões (morais, sociais, religiosas, econômicas etc.) com as quais seus personagens se defrontam. O sotaque italiano imposto ao elenco, prejudica o rendimento dos intérpretes mais tarimbados sem favorecer aqueles com menos ou quase nenhuma experiência diante das câmeras. Já que estamos falando em atores, o mais gritante defeito do filme é o abismo que separa as habilidades histriônicas das atrizes Glória Pires e Patrícia Pillar das de seus comparsas masculinos, Alexandre Paternost (Angelo) e Bruno Campos (Massimo), dois canastrões, o segundo com a agravante de parecer um galã típico das novelas do SBT. Vídeo: O Quatrilho Direção: Fábio Barreto Elenco: Glória Pires, Patrícia Pillar, Bruno Campos, Alexandre Paternost Distribuição: Cannes (tel. 011/725-5279) Texto Anterior: Outsiders destacam-se em ano atípico Próximo Texto: Baldwin compromete nova versão de "Um Bonde Chamado Desejo" Índice |
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