São Paulo, segunda-feira, 26 de fevereiro de 1996
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Redução de encargo trabalhista esbarra na reação dos lobbies

SHIRLEY EMERICK; MARTA SALOMON; VIVALDO DE SOUSA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Governo, trabalhadores e empresários querem cortar parte do custo do emprego, batizado de "custo Brasil", mas ninguém quer ceder.
É consenso que os gastos que os empresários têm sobre o contracheque do trabalhador são altos, atrapalham os produtos brasileiros a competir no mercado internacional e tornam mais difícil a contratação de mão-de-obra em tempos de economia desaquecida.
A primeira proposta formulada no governo Fernando Henrique Cardoso, há quase um ano, foi barrada por um forte lobby de empresários. O alvo, na época, era o "sistema S" (Senai, Sesi, Senac, Sesc, Senar, Sest, Senat), organizado por entidades patronais.
Essas entidades movimentaram, juntas, no ano passado, mais de R$ 2 bilhões -o equivalente a tudo o que foi gasto pelo governo na área social pelo programa Comunidade Solidária. O dinheiro é arrecadado pelo governo sobre a folha de salários e repassado aos empresários.
"Isso aqui não passa", afirmou à época o senador Fernando Bezerra (PMDB-RN), atual presidente da CNI, encarregando-se de tornar públicas as pressões contrárias a qualquer mexida no "sistema S".
Os empresários e dirigentes dessas entidades sugeriram outro alvo para a redução dos encargos: o salário-educação, que arrecada um ponto percentual a menos que os "S" e reforça o caixa do ensino fundamental.
O governo aceita tirar o salário-educação da folha de salários das empresas, mas considera o programa "intocável". Trata-se de impasse a ser resolvido pelos técnicos do Ministério do Trabalho e os tributaristas do governo: encontrar uma nova fonte de financiamento para a educação e também quem banque os programas das entidades patronais.
Penduricalhos
Na mais cara contribuição social que incide sobre a folha, ninguém toca. O ministro da Previdência, Reinhold Stephanes, deixou isso claro logo no início do debate.
Sem um novo imposto para financiar as aposentadorias e pensões, Stephanes não abre mão da contribuição de 20%, que representa a principal fonte de recursos para o pagamento de benefícios.
Os técnicos da Previdência indicaram que a redução do chamado "custo Brasil" sobre a folha deveria atacar as verbas que sustentam o Sesc, Senai, Sebrae e os outros "S". O próprio Stephanes tratou de batizar esse grupo de encargos de "penduricalhos". E argumentou: se a redução vai beneficiar os empresários, nada mais justo que eles contribuam.
A discussão acabou sobrando, no final do ano passado, para uma outra parte do custo extra da folha: a remuneração indireta dos trabalhadores, como o pagamento de multa sobre o FGTS em caso de demissão, 13º salário, aviso prévio e férias.
Um documento preparado pelo ministro Paulo Paiva (Trabalho) indicava a "flexibilização" desses direitos (além da redução de salário e jornada de trabalho, já autorizadas parcialmente) como um caminho para incentivar a contratação de trabalhadores, que poderia se tornar mais barata.
Esboço de acordo proposto pelos metalúrgicos de São Paulo levava à prática a teoria de Paiva e abria espaço para a contratação temporária de mão-de-obra com contribuição previdenciária reduzida e a suspensão do pagamento dos demais encargos.
A reação da Justiça do Trabalho, que enxergou uma agressão à lei, levou à suspensão do contrato. Esse impasse acabou acelerando os estudos do governo para mudar a legislação, incluindo aí a própria Constituição.
(Shirley Emerick, Marta Salomon e Vivaldo de Sousa)

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