São Paulo, segunda-feira, 26 de fevereiro de 1996
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Utopia?

VALDO CRUZ

BRASÍLIA - Uma das grandes expectativas em relação ao governo Fernando Henrique Cardoso era a sua atuação na área social. Controlada a inflação, as atenções do país se voltariam para a dívida social brasileira, estimada por técnicos do governo em R$ 80 bilhões.
Passado mais de um ano de administração tucana, porém, começa a surgir um sentimento de frustração. Não só pela falta de ações eficazes, mas também pelo discurso adotado pelo governo FHC.
O presidente e seus principais auxiliares têm dito, em outras palavras, que o crescimento do universo dos excluídos é uma fatalidade deste final de século. Um fenômeno não só brasileiro, mas mundial, diante da globalização da economia.
Lembram que a taxa de desemprego em alguns países da Europa chega a ser superior à brasileira. Uma tentativa de se justificar e, ao mesmo tempo, consolar o trabalhador brasileiro que perdeu o emprego nos últimos meses.
Como diagnóstico, tudo bem. O problema é que, ao tratar do tema, o governo tucano deixa a impressão de já ter entregado os pontos. Ou seja, não seria possível lutar contra o inevitável -o avanço da crise, que acabará conduzindo ao aumento da criminalidade.
Tal como um governo neoliberal, parece que os tucanos se contentam em lançar políticas compensatórias para minorar os efeitos perversos da estabilização e da modernização da economia. O agravamento da crise social faria parte de uma realidade fatal, com a qual o homem do século 21 teria de aprender a conviver.
Os argumentos de que o fenômeno não é só brasileiro são procedentes. Mas resignar-se diante desta constatação é o mesmo que abandonar o combate à corrupção porque ela acontece no mundo todo.
O presidente deveria se debruçar sobre as análises do sociólogo FHC e, como chefe do governo, tentar encontrar saídas para uma crise que realmente é mundial. Quem sabe o Brasil pudesse sinalizar o caminho a ser trilhado nos próximos anos.
Isso pode até parecer uma utopia. Mas, quando uma batalha é dada como perdida mesmo antes de travada, a derrota é quase certa. Ou tudo não passa de uma mera impressão.

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