São Paulo, sábado, 23 de março de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Bilhões em jogo

LUIZ GUSHIKEN

No debate sobre a reforma da Previdência há uma questão da maior relevância que até o presente momento tem sido ocultada. Trata-se do futuro da previdência complementar no Brasil, um terreno onde se movimentam bilhões e bilhões de reais.
Em nosso país há dois tipos de previdência complementar: os fundos abertos, com finalidade lucrativa, e os fundos fechados, sem finalidade lucrativa.
Os fundos abertos, amparados no sistema bancário, operam no mercado oferecendo seus planos de benefícios a quem queira participar. Utilizando-se até mesmo de propaganda enganosa, esses fundos são os grandes interessados em desmantelar a Previdência oficial, pois com isso poderão ampliar o universo potencial de participantes.
Acredito que os fundos abertos possam desempenhar no sistema de previdência um papel de complementação, mas nunca de substituição das responsabilidades do Estado. Entretanto, se não houver uma substancial atualização da legislação, com maior rigor na fiscalização, transparência nos balanços, menores taxas de administração, milhões de trabalhadores poderão estar comprando um sonho que jamais vai se materializar.
Já os fundos fechados (mais conhecidos entre nós como "fundos de pensão", embora essa expressão também se aplique à outra modalidade) não podem operar com todos os trabalhadores indistintamente, pois destinam-se a um público específico, ou seja, aos trabalhadores de uma mesma empresa (a patrocinadora).
Os fundos fechados constituem um bom negócio para a empresa, que os utiliza como política de recursos humanos, valendo-se inclusive de benefícios fiscais; um bom negócio para o trabalhador, que vê na complementação da aposentadoria uma segurança de amparo à sua velhice; e um ótimo negócio também para o governo, que tem nos fundos de pensão um poderoso instrumento de poupança interna.
O governo FHC já demonstrou que não tem um conhecimento mais acabado dessa matéria. A proposta de emenda da Previdência contém alguns dispositivos que, se mantidos, vão provocar demandas judiciais infindáveis e até mesmo inviabilizar a existência dos fundos dos funcionários das estatais.
Um deles determina que os fundos fechados ajustem atuarialmente seus planos de benefícios aos seus ativos integralizados. Isso quer dizer que toda receita futura proveniente de contribuições não poderá ser contabilizada para efeito de definição de benefícios. Os fundos de pensão fechados precisam ser aprimorados, mas não destruídos.
A previdência complementar no Brasil vive um momento decisivo, com redefinição de conceitos e tomada de novos rumos. Se este governo tivesse uma visão estratégica para o país, poderia dar a essa questão a atenção que ela realmente merece.

Texto Anterior: Garantia real de renda ao aposentado
Próximo Texto: Falta de autonomia
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.