São Paulo, segunda-feira, 25 de março de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Corporações freiam reforma nos Estados

ANA MARIA MANDIM
ENVIADA ESPECIAL A VITÓRIA E FLORIANÓPOLIS

Corporativismo e ausência de diálogo são as pedras no caminho da reforma administrativa. Espírito Santo e Santa Catarina são exemplos de como esses fenômenos podem até inviabilizar o processo.
Os dois são os Estados que, até agora, mais avançaram em iniciativas para racionalizar o funcionamento da máquina oficial.
Mas a verdade é que as providências tomadas para reduzir despesas ainda não tiveram efeito notável. Mais eficazes poderão ser as medidas para aumentar a receita.
Os números (veja as tabelas ao lado) demonstram, no entanto, que o esforço de arrecadação vem sendo neutralizado pelo avanço dos gastos.
O secretário da Fazenda do Espírito Santo, Rogério Medeiros, criou uma polícia fazendária (formada por policiais militares que atuam sob as ordens de fiscais) para autuar os sonegadores. Já foram lavrados mais de R$ 400 milhões em autos de infração.
Em Santa Catarina, seu colega, Oscar Falk, agilizou a cobrança aos contribuintes inadimplentes. Os impostos devidos totalizavam R$ 430 milhões em 31 de janeiro.
Durante 1995, 30 fiscais da secretaria julgaram 7.328 processos fiscais. Esse número, segundo Falk, é maior do que a soma dos julgamentos feitos no período 1991/94.
Obstáculos
No início de dezembro último, o governador do Espírito Santo, Vitor Buaiz (PT), enviou para a Assembléia Legislativa uma batelada de projetos de lei com os quais pretendia iniciar a reforma administrativa no Estado.
Três instituíam fundos para reequipar a polícia e o sistema penitenciário, e o quarto criava um conselho de direitos humanos.
Um mês depois, no dia 8 de janeiro, o governador de Santa Catarina, Paulo Afonso (PMDB), surpreendia seu Estado e o país.
Por meio de decreto-lei, limitava a folha de pagamento dos servidores a 65% da receita líquida disponível do Estado.
A medida resultaria no não-pagamento de 11% a 18% da folha, dependendo do volume da receita. Os servidores teriam um crédito correspondente à parcela retida dos salários, que seria paga quando o Estado tivesse recursos.
O Sintespe (Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público) entrou na Justiça para impedir que o decreto fosse aplicado e ganhou.
O Supremo Tribunal Federal entendeu que o princípio da irredutibilidade do salário se sobrepunha à prerrogativa do Estado, expressa na Lei Complementar Federal nº 82 (Lei Rita Camata), de limitar a despesa com a folha de pagamento.
'Caixas-pretas'
Os servidores que resistem a ser demitidos ou ver salários e benefícios reduzidos ou eliminados não são os únicos empecilhos ao controle dos gastos.
O Legislativo e o Judiciário, amparados na independência e autonomia dos Poderes, são "caixas-pretas" para o Executivo.
Este, o único que arrecada, recebe a conta que o Legislativo e o Judiciário lhe apresentam no final do mês, mas não tem acesso às folhas de pagamento dos outros Poderes.
Diminua ou cresça (o último caso é mais frequente), a conta tem de ser paga.
No Espírito Santo, por exemplo, o Judiciário aumentou de 4,62%, em 1994, para 6,76%, em 1995, sua cota de participação nas despesas do Estado com servidores.
Segundo uma funcionária da Secretaria da Fazenda, o Ministério Público estadual, quase um "quarto poder", alargou de 0,65%, em 1994, para 0,93%, em 1995, sua fatia dos gastos.
Estilos
Os governadores Vitor Buaiz e Paulo Afonso mostram estilos opostos de tocar a reforma administrativa.
Sob a lente de aumento dos deputados do PT e dos sindicatos filiados à CUT, Buaiz exercita sua capacidade de negociar.
Quando foi obrigado a retirar da Assembléia, por pressão dos servidores, os projetos de lei que enviara, ele retomou a discussão das propostas com os sindicatos.
Em Santa Catarina, os principais atores da reforma ainda não se sentaram para negociar. E parece não haver vontade política para isso -em nenhum dos dois lados.
Executivo e sindicatos travam guerra de decretos-leis e ações na Justiça, tornando mais custoso o processo da reforma.

Texto Anterior: MP proíbe acúmulo de rendimentos
Próximo Texto: Fórum capixaba facilita acordo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.