São Paulo, sexta-feira, 29 de março de 1996
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Gerald Thomas estréia um espetáculo linear

DA REPORTAGEM LOCAL

Gerald Thomas, 41, comemora efemérides em 96. Para os dez anos com Luís Damasceno, ator da Cia. de Ópera Seca, ele escreveu e encenou "Nowhere Man", que estréia hoje no Festival de Teatro de Curitiba.
Para os dez anos de "Quartet", uma montagem sua com Tônia Carrero, ele remontou o texto com novo elenco e de forma "extremamente realista". A peça abre em Curitiba semana que vem e chega a São Paulo dia 18 de abril.
Em entrevista, ele diz o que o levou a escrever e encenar, com "Nowhere Man", uma peça que "tem muita palavra e tem muito pouca imagem."
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Folha - Você mistura "Fausto", de Goethe, com "Quincas Borba", de Machado de Assis?
Gerald Thomas - Tem ingredientes, sem dúvida... Mas a coisa mais importante é que este é o trabalho mais linear, tem princípio, meio e fim. Só que o início está no fim, mas, enfim, é linear. Eu fiz uma coisa com ação e reação e coisa e tal. E eu escrevi uma peça para o Damasceno, que é um ator stanislavskiano, linear. Nunca tinha escrito uma peça para ele antes.
Folha - Você escreveu nos ensaios ou já chegou com o texto pronto?
Thomas - Eu cheguei com 70% do texto pronto e o resto eu escrevi aqui. É, sem dúvida nenhuma, o melhor espetáculo que eu já fiz.
Folha - Alguma relação com o fato de ser um espetáculo de narrativa linear?
Thomas - É, talvez, porque eu não tenho nada para esconder mais. Eu sempre me escondi muito atrás das coisas. Atrás de significados obscuros e tal, ou de uma certa vontade deliberada de criar um choque estético. O Damasceno praticamente conversa com a platéia, durante uma hora e meia.
Folha - Ele é, dos seus atores, aquele de mais empatia.
Thomas - É.
Folha - Por que você escreveu especificamente para ele?
Thomas - Porque são dez anos... A gente comemora agora, em março, dez anos de trabalhos juntos. Ele começou com "Carmem com Filtro", que foi a segunda peça que eu fiz no Brasil. Os ensaios começaram em março de 96. O Damasceno vem desde essa época. Agora, eu não interfiro, eu deixo o Damasceno. Ele está solto ali, falando com o público. Não tem muito efeito de luz. Ele conversa com a platéia.
Folha - Você diria que é um espetáculo de autor?
Thomas - É.
Folha - Quer dizer, você olha o espetáculo como um dramaturgo, sentado na platéia, vendo o que o ator faz com o texto.
Thomas - É. Eu dirijo, sem dúvida. Mas o Damasceno pegou o texto em uma semana, pegou e abocanhou para ele e a coisa é dele.
Folha - "Nowhere Man" vai fazer o que, em Curitiba, uma estréia ou um ensaio aberto?
Thomas - Eu achei que eu ia fazer um ensaio, que não ia ficar pronto, mas está pronto... O Fausto é um cara que tenta emigrar e se transformar culturalmente através do travestimento cultural, abocanhando outras culturas, e o que eu uso é uma música do Chico Buarque, "Quem te Viu, Quem te Vê", em sueco, que é o maior travestimento. E emociona muito.
Folha - Você está comemorando dez anos com Damasceno, com "Nowhere Man", e ao mesmo tempo está remontando "Quartet", que também completa dez anos. Você está fazendo uma revisão?
Thomas - Pode ser. Tem até uma alusão a isso no espetáculo. Uma frase que fala: "Essas idéias que a gente considera geniais em cada década e, quando vê na década seguinte, não passou de um peido na floresta". O "Quartet" que eu montei com a Tônia (Carrero) tinha um estilo completamente diferente. Agora a peça é realista. A peça está num açougue, extremamente realista, e a linguagem do Heiner Mller se transforma quando ela é tratada assim.

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