São Paulo, sexta-feira, 29 de março de 1996
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O roto e o esfarrapado

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - O desabafo presidencial, em São Paulo, a respeito dos furos, rombos e furtos nos bancos oficiais, principalmente no Banco do Brasil, revelou mais uma vez o tipo de político fisiológico que ele é. Assumiu tom irritado, civicamente indignado, culpando seus antecessores imediatos de incúria e acomodação.
Com menos da metade do seu mandato, FHC já se inseriu no mesmo quadro de incúria e acomodação. Acredito até que, em se tratando de números, ele supera os ex-presidentes acomodados que não souberam ou não quiseram dar um basta à roubalheira.
O único exemplo que tivemos de uma punição parcial foi o de Collor. Para isso, foi necessária uma CPI. O governo da época brandiu o mesmo argumento que FHC levanta para impedir a CPI dos Bancos: não se deve botar fogo no país.
Collor foi impedido e o país não pegou fogo. Sem a CPI -todos sabemos disso- ele teria completado o mandato e talvez ainda estivesse no poder, pois teria cara-de-pau suficiente para subornar congressistas e obter a reeleição. Na recente história do Brasil, instalou-se um banditismo administrativo que recebeu o suave nome de fisiologismo.
Se o presidente da República deseja mesmo moralizar a vida pública e não repetir a incúria e acomodação de seus antecessores, tem agora uma excelente oportunidade para isso: basta aposentar a caneta e o Diário Oficial, negando-se a praticar de forma tão despudorada a estratégia da barganha e a tática do suborno que vem usando para impedir a CPI.
A menos que ele saiba o que fez (ou deixou de fazer), colocando-se na mesma situação de Collor, ou seja, na marca do pênalti. Sua posição não é cômoda -e ele tem consciência disso.
Não aceitando a CPI, lança grave e irreparável mancha sobre sua biografia. Aceitando a CPI, pode até repetir o exemplo de Collor. Faria uma exótica, mas divertida dupla de brasileiros em Miami.

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