São Paulo, sábado, 30 de março de 1996
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Amar é perdoar

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

A Semana Santa, no ciclo litúrgico, renova, cada ano, o convite para reafirmarmos nossa fé no ato de amor de Jesus Cristo, que deu sua vida para nos salvar do pecado, reconciliar-nos com Deus e fazer-nos felizes.
Nesta vida temos, sem dúvida, experiências que nos revelam a atração profunda que há em nós para o amor e a admiração que sentimos diante de grandes exemplos de doação.
Quem não se maravilha diante da beleza do amor materno, totalmente dedicado, sem medir sacrifícios, a dar e promover a vida de sua criança?
Conhecemos gestos de extrema generosidade entre pais e filhos e entre amigos. Hoje, um ato que nos impressiona é a doação de órgãos para salvar a saúde e a vida de parentes e até de desconhecidos.
No campo da dedicação filantrópica e religiosa, presenciamos o cuidado pelas crianças abandonadas, pelos portadores de deficiência, pelos enfermos, até com doenças infecciosas.
Que dizer dos atos heróicos de quem se ofereceu no campo de concentração, como frei Maximiliano Kolbe, para substituir, como refém, e morrer em lugar de seu companheiro?
No entanto, a expressão mais forte de amor que temos na história é a da misericórdia de Deus, que nos perdoa por meio de Jesus Cristo.
Pela fé sabemos que Deus Filho assumiu a natureza humana, escolhendo uma vida solidária com os mais pobres, anunciou a boa nova da nossa redenção, submetendo-se à injusta condenação e à morte de cruz para nos manifestar seu amor e perdoar nossos pecados.
Deus não esmorece diante de nossas faltas. Continua sempre nos amando e nos leva ao arrependimento e correção. Eis aí a mais bela manifestação do seu amor gratuito.
Para revelar a infinita misericórdia divina, Jesus narrou a parábola do pai que perdoa o filho pródigo (Lc 15, 11-32). O centro da mensagem está na expectativa constante do pai que espera a volta do filho pecador. Jesus insiste na alegria de Deus ao perdoar e receber em seus braços e beijar o filho arrependido.
A mesma alegria marca a parábola do bom pastor que traz nos ombros a ovelhinha desgarrada (Lc 15, 3-6).
O cerne da Semana Santa encontra-se na resposta de gratidão que somos chamados a dar a Deus pelo perdão que concede à humanidade, graças à paixão, morte e ressurreição de Cristo.
Converter-se é acreditar no amor de Deus que nos perdoa, corrigir-se das próprias faltas e assumir para com os outros a mesma atitude de perdão e amor gratuito. Perdão a todos. Perdão e reconciliação entre os cônjuges.
Perdão na família, superando ressentimentos. Perdão até aos inimigos, como a religiosa irmã Lúcia Vetruse, violentada na Bósnia. Perdão na Ruanda, na Tchetchênia e entre grupos conflitantes do Médio Oriente.
Na Semana Santa, a Igreja nos convoca a contemplar Jesus Cristo e a proclamar a verdade da misericórdia divina. A celebração mais forte e profunda da vitória de Cristo em nós é a de acreditarmos que o perdão que Ele nos dá converte o nosso coração e nos faz capazes de nos perdoarmos uns aos outros.
Que a mãe de Deus, que se uniu ao perdão de Cristo crucificado, faça-nos compreender que só haverá um mundo melhor e mais humano, sinal do Reino de Deus, quando, também para nós, o amor se identificar com o perdão.

D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.

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