São Paulo, sábado, 30 de março de 1996
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Um ato de consciência

MARINA SILVA

A extinção da contribuição sindical, que corresponde a um dia de salário de todos os trabalhadores com carteira assinada, já atingiu um razoável consenso na opinião pública. Mas há ainda muitos sindicalistas preconizando a manutenção desse instituto. Alguns o defendem por incompreensão da natureza do regime democrático e outros por ser tal contribuição a única forma de manter aqueles que sobrevivem como membros da burocracia sindical.
Infelizmente, o arcabouço jurídico-sindical, edificado no Brasil a partir da década de 30, tem sido a contramão do caminho rumo à efetiva democracia. O tripé unicidade, enquadramento e contribuição sindicais constitui a espinha dorsal de uma estrutura sindical burocratizada e inadequada para o enfrentamento dos desafios postos pelas transformações sociais recentes.
Transplantado da "Carta del Lavoro" de Mussolini (1939) pela ditadura Vargas, a contribuição impôs aos sindicatos a tutela do Estado. Na época criou-se uma situação, típica dos regimes autoritários que entendem os sindicatos como parte do aparelho estatal, para propagar a idéia de integração e superação dos conflitos políticos.
Se hoje não permanece válido o viés fascista, o vício de origem gerou resultados perversos para o aprimoramento do movimento sindical. Este se estreita por essa via, quando deveria buscar permanentemente sua expansão por meio da filiação de trabalhadores.
O movimento sindical só será expressão da cidadania ativa dos trabalhadores se for por eles espontaneamente sustentado. Caso contrário o sindicato torna-se um prédio com dezenas de tabuletas e carimbos. Mas jamais força de pressão contra os patrões e interlocutor necessário das instituições.
A liberdade e a autonomia não são compatíveis com nenhuma contribuição compulsória nem com a unicidade forçada ou com o enquadramento vindo do alto. O fim da contribuição sindical obrigatória é um primeiro passo.
A formação de uma consciência que leve ao reconhecimento da necessidade das estruturas sindicais deve emergir do movimento operário em seu cotidiano. É no reconhecimento de seu papel social, de sua posição na produção e no desfrute da riqueza social que se funde essa consciência do trabalhador.
Isso não pode ser imposto sob pena de os sindicatos serem transformados em mecanismos de garantia do status quo quando devem ser de transformação social.

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