São Paulo, domingo, 31 de março de 1996
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Uma história (muito) mal contada

ALOYSIO BIONDI

O governo entregou R$ 3,0 bilhões ao Unibanco, no desmantelamento do Nacional, porque havia uma diferença entre os ativos, de R$ 6,1 bilhões, e os passivos, de R$ 9,1 bilhões. Foi o que disse o chefe de fiscalização do Banco Central, Claudio Mauch, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, .
Ora, o relatório de diretoria do Unibanco diz que foram assumidos passivos e ativos iguais, "ambos de R$ 6,5 bilhões".
E um dos maiores bancos do mundo, o Salomon Brothers, recomenda aos investidores as ações do Unibanco, apontando que ele passou a ter ativos de R$ 24 bilhões, "após ter absorvido R$ 9 bilhões em ativos do Nacional". Onde está a verdade?
Justifica-se formar uma CPI para rever a operação, que ameaça deixar um rombo de R$ 6,0 bilhões para o Tesouro.
Esta coluna tem feito análises para mostrar que o Nacional foi estranhamente doado a outro grupo, enquanto o Tesouro ficava com um rombo bilionário.
Algumas conclusões expostas em nosso artigo da última terça-feira mereceram novas ponderações do colega Luís Nassif.
Mesmo que se considere a polêmica encerrada, não se pode deixar, em respeito ao leitor, de avaliar alguns argumentos de Nassif, apresentados na coluna "Micos e Lucros" (27/03):
cf4\>Podre - Esta coluna condenou o esquartejamento que o governo fez do Nacional, entregando a parte boa ao Unibanco e ficando com a parte podre. Defendeu a alternativa de intervir no Nacional, recuperá-lo com os lucros da parte boa.
Nassif nos acusa de "inverter a lógica". Diz, como exemplo, que se um feirante comprar uma partida de limão, não vai querer que a metade esteja podre. Sofisma. Um banco não é um limão. Gera lucros e cobre prejuízos. Limões não. Óbvio. Lógico.
Ágio - esta coluna ressaltou que o Unibanco não quis comprar o Banco Nacional. Ficou só com os "negócios da clientela". Só com a parte boa dos negócios.
Dissemos que o Unibanco deveria ter pago corretamente por isso, lembrando que o valor de qualquer empresa não é fixado com base apenas em suas instalações, estoques etc., e sim de acordo com o potencial de lucro". Lógico, óbvio.
Nassif volta a dizer que não. Se há R$ 6,5 bilhões de ativos e R$ 6,5 bilhões de passivos, argumenta, então "é igual a zero, e não a R$ 13,0 bilhões".
É penoso precisar demonstrar o óbvio, mas não há alternativa: R$ 6,5 bilhões de ativos e R$ 6,5 bilhões de passivos são um negócio de R$ 13,0 bilhões, sim.
Os passivos incluem os depósitos -1,25 milhão de clientes, no caso do Nacional-, que podem ser usados para empréstimos, que rendem juros, lucros.
Ativos e passivos de R$ 13,0 bilhões significam "faturamento", com uma clientela formada ao longo de décadas. Vale zero?
De presente - O Unibanco pagou ágio de valor ridículo para receber várias empresas do Nacional; duas de leasing, uma de Previdência, dois bancos e três agências no exterior.
O valor foi simbólico, apenas pela clientela" do banco, da seguradora e da administradora de cartões de crédito.
Pelas três, um ágio de R$ 300 milhões (e sem que o Nacional pagasse um tostão por toda a estrutura, equipamentos de informática etc. do banco).
Nassif diz que, no caso da seguradora, o patrimônio líquido evaporou porque era formado em parte por R$ 175 milhões de ações do próprio banco Nacional, que "viraram" pó com o esquartejamento. Mesmo assim, o patrimônio líquido da seguradora ficou em R$ 301 milhões.
Descontado um aumento de capital, feito presumivelmente pelo Unibanco, ele é de R$ 103 milhões. Descontado do ágio de R$ 300 milhões, sobram R$ 200 milhões para "pagamento" pela clientela do banco e cartão de crédito. Presentão.

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