São Paulo, domingo, 31 de março de 1996
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"Poema é tedioso, mas de Shakespeare"

OTÁVIO DIAS
DE LONDRES

Professor de literatura inglesa da Universidade de Vassar (EUA), Donald Foster dedicou 12 anos de estudo a "Uma Elegia Fúnebre".
Com auxílio de um programa de computador criado por ele, o professor acredita ter provas conclusivas de que Shakespeare é o autor do poema. "Tenho hoje extensivas evidências de que os hábitos linguísticos do autor da elegia, assim como suas leituras e influências, casam-se perfeitamente com os de Shakespeare", disse à Folha.
(OD)
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Folha - Quais são os motivos que o levam a afirmar que William Shakespeare é o autor do poema "Uma Elegia Fúnebre"?
Donald Foster - A primeira vez em que me interessei pelo poema foi há cerca de 12 anos, não porque eu gostasse de poema, mas porque ele era um rico repositório de alusões ao trabalho de Shakespeare que até então havia passado desapercebido. O autor, obviamente, tinha lido textos de Shakespeare, inclusive textos que não haviam sido publicados até 1612, ano em que a elegia foi escrita. O poema tornou-se interessante para mim apenas quando um estudo detalhado do texto mostrou que os empréstimos que W.S. fez de Shakespeare não poderiam ser explicados como uma imitação consciente.
Depois de cerca de sete anos de investigação, concluí que a defesa da autoria de Shakespeare era inconclusiva, em especial devido à inexistência de evidências externas ao poema que pudessem revelar o verdadeiro autor. Por exemplo, não havia provas de que Shakespeare conhecesse William Peter, o jovem homenageado na elegia.
Em 1989, publiquei o livro "Elegia por W.S.", em que levantei argumentos favoráveis e contrários à existência da mão de Shakespeare no poema. Só que agora a situação mudou, em grande parte devido à existência de recursos tecnológicos que nos permitem fazer uma análise muito mais ampla das evidências internas de um texto.
Folha - Que recursos são esses?
Foster - São programas de computador que conduzem pesquisas rápidas em quantidades enormes de "databases de textos", como por exemplo os arquivos eletrônicos da Universidade de Oxford. Tenho hoje extensivas evidências de que os hábitos linguísticos do autor do poema casam-se perfeitamente com os de Shakespeare.
Folha - Que evidências são essas?
Foster - É hoje claro que W.S. usa palavras e estilos retóricos que não são encontrados fora de Shakespeare, que W.S. leu os mesmos textos que Shakespeare estava lendo entre 1610 e 1613, inclusive um e provavelmente dois manuscritos que circularam dentro da companhia de Shakespeare. Essas conclusões são resultado de cuidadosa análise de vocabulário, estrutura gramatical, métrica etc., realizada com auxílio do computador.
Folha - O que o sr. teria a dizer sobre a qualidade da elegia?
Foster - Diria que a elegia é tediosa e imprecisa, não tem a sofisticação dos melhores trabalhos do autor.

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