São Paulo, quarta-feira, 3 de abril de 1996
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CPI: exigência da sociedade

MILTON TEMER

Um novo requerimento para a instalação de CPI com o objetivo de investigar as relações promíscuas entre o Banco Central e os banqueiros chegou à Mesa da Câmara dos Deputados.
Em apenas três dias, e mesmo no meio do fogo cruzado do primeiro turno da batalha da Previdência, 180 deputados federais, entre eles vários parlamentares pertencentes à base política do governo, fizeram questão de levar em conta o que exige a grande maioria da opinião pública nacional e aderiram ao documento.
A bola agora está nas mãos do presidente da Câmara, deputado Luís Eduardo Magalhães, que não pode deixar de levar em conta um aspecto essencial: ele ocupa aquela cadeira não em nome de um partido político, mas em nome do conjunto da nação.
Em cada decisão sua está em causa a imagem do Poder Legislativo. Sobre a qual, nos últimos dias, os veículos de comunicação não foram exatamente lisonjeiros ao fazerem o balanço das votações sobre a reforma da Previdência Social e CPI dos Bancos, no Senado.
O espetáculo de fisiologismo explícito ocupou grandes espaços nos jornais, no rádio e na televisão, produzindo um profundo desgaste para ambas as casas do Parlamento.
Por outro lado a pesquisa Datafolha, constatando que 76% dos paulistanos apóiam a instalação da CPI para investigar os bancos, ainda que fosse possível imaginar que isso pusesse em risco a estabilidade da economia, não é um dado de menor importância.
Até por que pesquisa de opinião é o que a maioria governista mais leva em conta quando lhe faltam argumentos racionais para defender as propostas de FHC.
Tudo isso torna indispensável aprofundar o debate sobre a CPI para melhor esclarecer seus objetivos e suas circunstâncias. Pois, a partir da sucessão de denúncias de irregularidades que pontilharam o noticiário sobre o sistema financeiro desde agosto do ano passado, não há mais como ocultar contornos da maior suspeição em todos os movimentos oficiais.
Primeiro com o episódio do Econômico, agora sendo concluído sob a batuta do senador Antônio Carlos Magalhães -uma perigosíssima operação com esse bizarro banco Excel, empresa investigada pelo próprio BC e associada a um banco suíço que tem dois executivos hoje trancafiados numa prisão federal americana por envolvimento em lavagem de dinheiro do narcotráfico.
Depois com o episódio do Nacional, quando o presidente do BC tomou conhecimento (em 5 de outubro) do rombo de R$ 4,6 bilhões, sem considerar de pronto a necessidade de instalar uma investigação sobre as responsabilidades dos controladores da instituição naquela falsificação grosseira.
Loyola tem que explicar por que, e por determinação de quem, só tomou providências um mês depois, numa madrugada de sábado, junto com o presidente e o ministro da Fazenda, e assim mesmo para continuar facilitando a vida dos controladores -editando a medida provisória do Proer, por meio da qual encontrou-se o caminho de entregar a parte boa do Banco Nacional ao Unibanco, com um prejuízo público da ordem, pelo menos, de R$ 5,8 bilhões.
Não é, portanto, a CPI que traz risco ao sistema financeiro e à economia em geral. Pelo contrário, risco é não investigar essas relações de promiscuidade e varrê-las para debaixo do tapete.
Sabem o governo, os dirigentes do BC, os investidores e agora vai chegando ao conhecimento da sociedade que o sistema financeiro privado do país não pode continuar operando nesse jogo permanente de toma-lá-dá-cá à custa da viúva. E nem o sistema público pode continuar submetido aos segredos da tecnocracia subalterna, que só pensa o estágio no Estado como forma de garantir sociedade em outro banco tão logo volte ao setor privado.
Impedir por quaisquer meios, mais uma vez, a instalação da CPI dos Bancos, neste momento, só tem um objetivo possível: proteger banqueiros que lesaram a fé pública e poupar da cobrança legítima da sociedade autoridades governamentais evidentemente envolvidas em graves omissões.
Mais do que nunca a mobilização da sociedade civil brasileira é fundamental para garantir que os avanços democráticos alcançados nos últimos 15 anos não fujam pelos esgotos da impunidade dos nobres de beca universitária. As ruas têm a palavra. E o presidente da Câmara, Luís Eduardo Magalhães.

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