São Paulo, domingo, 21 de abril de 1996
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A dívida preocupa (3)

CELSO PINTO
DE QUEM FOI A RESPONSABILIDADE?

A maior culpa foi do próprio governo federal, que piorou suas contas em 3,7% do PIB neste período. Vieram depois os Estados e municípios, com uma piora de 2%, e as estatais, com apenas 1%.
Isso não quer dizer que a situação dos Estados e municípios não preocupe. Ao contrário, o estoque da sua dívida é recorde, como indicam dados de um estudo dos economistas Alberto Furuguen, Satossi Abe e Luis Pamplona Pessôa, para o Banco Garantia (que eu examinei também nas duas colunas anteriores).
Sua dívida, medida em dólares, chegou ao pico de 12,9% do PIB no final do ano passado. É o dobro do que era em 1991 (6,3% do PIB). Durante a década de 80, ela oscilou entre 5% e 7% do PIB.
A dívida bruta dos Estados chegou a US$ 79 bilhões em dezembro de 95, dos quais 42% em títulos (dívida mobiliária), 49% em contratos e garantias, 6% em dívida externa e 3% em dívidas bancárias (AROs). A trajetória da dívida mobiliária foi explosiva: passou de 2% do PIB em 91 para 6% em 1995, com 92% do total concentrado em São Paulo, Minas, Rio e Rio Grande do Sul.
Pouco antes do Plano Real (junho de 94), o BC trocou a maior parte dos papéis estaduais pelos seus, temporariamente, para serem usados como lastro a um custo menor. Os Estados pagam o serviço e, teoricamente, serão responsáveis pelo principal.
Não há, contudo, garantias, e a dívida mobiliária estadual está crescendo, hoje, a 50% ao ano. O total já chegou, em fevereiro, a R$ 37 bilhões, e fica difícil imaginar que ela não acabará absorvida pelo governo federal.
A pior situação, de longe, é a do Estado de São Paulo, com uma dívida bruta de US$ 49 bilhões, equivalente a 35% do seu PIB.
Parte desta dívida estadual, como lembra o estudo, está sendo empurrada para o governo federal, o que cria um risco adicional. Enquanto os Estados têm limites naturais por não poderem emitir, o governo federal pode emitir moeda ou títulos.
A trajetória da dívida líquida do governo federal foi diferente. Desde 1982, quando era de 10% do PIB, ela subiu sem parar até 23% em 89.
O confisco financeiro e o calote do Plano Collor fizeram o estoque da dívida cair para 14% do PIB em 90 e continuar a cair, em função da redução de seu custo, até 9% em 93. Desde então, ela deu um salto para 15,9% do PIB no ano passado.
A terceira fatia da dívida pública é a das empresas estatais. Em 82, elas tinham uma dívida líquida equivalente a 20% do PIB. Ela manteve-se neste patamar até 86 e, desde então, vem caindo. No ano passado, a dívida foi de apenas 8% do PIB.
Esta melhora sensível na posição de endividamento das estatais deveu-se, segundo o trabalho, à conjugação de três fatores: preços alinhados, tarifas realistas e privatização.
Privatizar reduz o estoque da dívida pública. Como a dívida total das estatais era de US$ 46,5 bilhões no final de 95, se, teoricamente, o governo doasse todas as suas empresas, em todos os níveis, a dívida pública cairia nesta proporção. Supondo que as estatais fossem vendidas por US$ 30 bilhões, a dívida pública poderia ser abatida em US$ 76 bilhões, ou 36% do total.
É claro que nem todas as estatais serão vendidas e estes números são apenas exercícios teóricos. O argumento do trabalho, de todo modo, é que a privatização pode ser um instrumento decisivo nos próximos anos para impedir que a dívida líquida global do setor público cresça demais e "nos leve novamente a uma situação parecida com a que estimulou a formulação do Plano Collor". Ou seja, ao calote.

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