São Paulo, sábado, 27 de abril de 1996 |
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O voto dos presos
RENATO GOMES NERY O recente episódio do Centro Penitenciário Agroindustrial de Goiás (Ceipago), como foi, no passado, o do Carandiru, são os exemplos mais acentuados e chocantes do caos que se instalou no sistema penitenciário no Brasil, sem que seja apresentada ou viabilizada uma solução ao problema.Segundo o Censo Penitenciário de 1994, publicado pela Folha em 7/04 (pág. 3-4), temos o seguinte diagnóstico: havia no Brasil 129.169 presos distribuídos em 511 penitenciárias e presídios. O número de vagas era de 59.954, com uma média de dois presos para cada vaga e um déficit de 69.215 vagas; 69.129 condenados cumprindo pena regularmente (53%); 22.301 condenados cumprindo penas irregularmente (17,3%) e 12.468 presos provisórios em presídios (9,6%). Que o Brasil necessita de uma política sólida para o sistema carcerário não há dúvidas. Que o sistema prisional precisa ser reformado, também. Mas falta vontade política para que isso aconteça. Os segregados não têm voz nem representação, encontrando na rebelião o único meio de serem ouvidos. Constituem um estorvo que foi abandonado nas prisões. Em que pese não haver a pena de morte formal no Brasil, não há como negar que milhares de pessoas foram condenadas a uma pena de morte lenta, dolorosa e contínua e, dentre elas, estão os detentos. Os presos não são frutos do acaso, eles surgiram no seio da sociedade que os produziu, os embalou, os encarcerou e os esqueceu. A sentença criminal transitada em julgado gera automaticamente, enquanto durar seus efeitos, a perda dos direitos políticos do condenado, conforme o inciso 2 do artigo 15 da Constituição. Os presos e os cidadãos em geral, fora dessa hipótese, não perdem os seus direitos políticos a não ser por outro motivo previsto na Constituição. O fundamento de tal norma, segundo alguns constitucionalistas, advém simplesmente de não ser "ético, já que o criminoso não é idôneo para participar dos negócios públicos", como afirmou Pontes de Miranda, citado por Ives Gandra Martins ("Comentários à Constituição do Brasil", vol. 2, pág. 595). Será, também, que é ético aprisionar as pessoas e dar-lhes o tratamento que lhes é dispensado nas penitenciárias, cadeias e presídios públicos? Cremos que essa situação possa ser revertida, restaurando-se parte dos direitos políticos dos condenados ao se permitir que eles possam somente votar, mas não serem votados. Não cremos que exista inconveniente, uma vez que o menor de até 16 anos e os analfabetos também não podiam votar e hoje votam, sem, entretanto, poderem ser votados. Se temos dois cidadãos que podem, por exemplo, ser chamados de 2ª categoria, por que não termos também um terceiro. A doutora Maria da Graça Diniz Belov, membro da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB, é a mentora da idéia, sobre o que denominamos de voto do preso. Segundo ela, não seríamos os primeiros a adotá-la e a colocá-la em prática, uma vez que o voto do preso já é uma realidade nos EUA, e não consta que a situação dos presos lá seja, ao menos, parecida com a dos segregados brasileiros. Texto Anterior: Juiz não enxerga o rosto do réu Próximo Texto: Loucuras na revisão Índice |
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