São Paulo, domingo, 5 de maio de 1996
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O sequestro de Benguell

3 Internamente, a ALN tinha um programa pela derrubada do movimento militar e a implementação do socialismo. No exterior, a organização pregava a "união das forças democráticas antifascismo". Uma rede de apoio internacional se armava. Fazia-se contato e procurava-se explorar as relações.
Uma adesão acabou indiretamente interferindo na escolha de Glauber. Norma Benguell, musa do Cinema Novo, foi sequestrada por um grupo paramilitar, em setembro de 68, em São Paulo. Foi colocada violentamente num Fusca e despachada ao Rio, onde ficou dois dias presa no PIC (Pelotão de Investigação Criminal).
Depois de solta, ela procurou o comandante Marquito, da ALN, e se ofereceu para trabalhar para a organização, que enviou Itoby Correa para acertar com a atriz seu trabalho político. Ela sugeriu à ALN contato com Gianni Amico.
Aloysio Nunes Ferreira era estudante em São Paulo e membro de um GTA. Foi a Paris, onde ganhou uma bolsa de estudos, observou interesses de grupos europeus pela luta armada brasileira e requisitou a Marighella documentos; guerrilheiros venezuelanos tinham conseguido dinheiro na Itália; centrais sindicais e setores independentes do PCI (Partido Comunista Italiano) empunhavam solidariedade; os movimentos de libertação achavam apoio até em uma condessa do Vaticano, cujo nome nunca foi divulgado. Foi Aloysio quem contatou Gianni.
Em maio de 69, Itoby é enviado à Europa levando o manifesto "Aos Democratas Antifascistas Europeus" e o "Manual do Guerrilheiro Urbano", ambos de Marighella, manual que foi publicado e transformado em best seller na Europa. Itoby tinha outras missões: divulgar e discutir a estratégia de luta da ALN e pedir a colaboração de grupos europeus.
Sair do Brasil não era tarefa fácil para os militantes "queimados" (conhecidos pela polícia). A rota era a fronteira sul. No Uruguai e na Argentina, grupos de apoio ligados aos Tupamaros e Montoneros (organizações de guerrilha) davam guarida. Viajava-se com passaporte falso feito numa gráfica de Argel (Argélia), onde o governador de Pernambuco cassado em 64, Miguel Arraes, exilado, negociava com os argelinos o apoio à luta armada do país.
A entrada da Europa era por Roma, onde o militante apresentava-se a um funcionário da embaixada cubana, passava a senha e a documentação. Se o destino era Cuba, de Roma se seguia a Praga. Lá, um segundo diplomata cubano já estava a postos no aeroporto.
Diálogo de "Terra em Transe":
- Você é um tipo anarquista, mas ainda pode ser aproveitado.
- Ora, não precisa ser gentil...
- Você tem compromissos.
- Quais? Eu nunca assumi, e com que armas vou lutar?

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