São Paulo, domingo, 5 de maio de 1996
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Pessimismo domina opinião pública no México

JORGE CASTAÑEDA

Mais uma vez o abismo entre a percepção que o México tem de si mesmo e a visão que o resto do mundo tem de sua situação toma conta da análise, das previsões e da compreensão do que realmente acontece no país asteca.
Fora do México, a impressão que se tem da recuperação econômica, da reforma política e da liderança do presidente Ernesto Zedillo melhorou sensivelmente. Mas dentro do país o pessimismo que domina a opinião pública desde dezembro de 1994 se aprofundou.
Funcionários e comentaristas estrangeiros, quer trabalhem para instituições financeiras internacionais ou para a imprensa financeira mundial, elogiam a estabilização dos indicadores macroeconômicos.
Já os mexicanos põem ênfase na deterioração contínua de suas condições de vida: não apenas o agravamento da situação microeconômica, mas também a falta de perspectivas para o futuro, em vista das restrições invariáveis e dramáticas ao crescimento econômico. Quem tem razão, e por quê?
Os admiradores de Zedillo no exterior assinalam vários fatores indicadores de melhora. A taxa de câmbio parece haver se estabilizado, a Bolsa se encontra em pleno auge, as taxas de juros caíram e a inflação está quase sob controle. Os US$ 30 bilhões a curto prazo em bônus do Tesouro mexicano foram pagos pontualmente e refinanciados, e a maioria das empresas eliminou ou reduziu o risco de moratória.
Se a esta descrição cor-de-rosa acrescentarmos o início de um crescimento, pelo menos aritmético, do produto durante o segundo trimestre do ano -nada difícil, em vista da queda de 10% ocorrida no trimestre equivalente do ano passado-, poderíamos concluir que existem bases sólidas para uma visão alentadora da recuperação do México.
A pergunta consiste, então, em saber porque tão poucos setores da sociedade mexicana compartilham esse otimismo, e porque o presidente Zedillo e sua equipe se encontram cada vez mais isolados, acossados e vítimas de uma impopularidade crescente.
Existem algumas explicações evidentes: milhões de mexicanos estão endividados até o pescoço, à medida que capitalizaram os juros de mora provocados pela elevação astronômica das taxas; o setor bancário vem precisando de infusões cada vez maiores de recursos; a demanda interna não se recuperou, as vendas continuam estagnadas e as empresas não-exportadoras atolaram num misto de dívida e paralisia; e, em último lugar, milhões de mexicanos perderam seus empregos graças a uma contração de 7% na economia no ano passado.
É cada vez mais difícil compreender como a economia poderá voltar a crescer, à luz dos US$ 170 bilhões da dívida externa total. Hoje, o débito representa uma porcentagem maior do PIB do que em 1982, quando começou a crise latino-americana da dívida.
Por tudo isso a sociedade está alarmada e descontente com a política econômica e social do regime. De fato, o derradeiro apoio do governo vem de Washington.
Desde o ponto de vista do observador estrangeiro de curto prazo, parece, de fato, que o México se recuperou: o perigo da moratória foi superado e os lucros voltaram, embora talvez mais exíguos. O México, como mercado emergente, voltou a ser visto como viável.
O que levou muitos círculos mexicanos antes esperançosos a perder sua confiança totalmente é o sentimento de perigo iminente provocado pela situação atual do país.
Muitos mexicanos que até agora acreditavam que o povo aguentaria qualquer coisa e que com o tempo a economia, e todo o resto, iria recompor-se quase por inércia começaram a sentir sérias dúvidas em relação ao futuro imediato. Não podem deixar de lamentar a ausência de estratégia governamental, seja para fixar a política cambial ou para combater o narcotráfico, seja para definir uma política industrial ou combater a pobreza.
Assim, a persistente incapacidade do sistema político em promover o traçado e a concretização dos grandes pactos sociais de que o país sempre precisou para crescer suscitou um mal-estar que nenhuma alta na Bolsa de Valores é capaz de dissipar.
Os dois erros que seria desejável evitar no momento saltam à vista. O primeiro consiste em diferenciar a opinião das corretoras financeiras do enfoque que outros interesses estrangeiros deveriam adotar. Por exemplo, faz sentido que Wall Street volte a sentir confiança em seus investimentos no mercado mexicano, mas seria absurdo se o governo dos EUA concluísse que os problemas migratórios em sua fronteira com o México se dissiparam, ou se os Ministérios da Economia dos outros países latino-americanos acreditassem que a crise mexicana acabou.
O México também deveria evitar confusões em relação à imagem que faz de si próprio. O país precisa entender que as últimas fontes de análise ou previsão às quais convém dar ouvidos são os mercados internacionais.
Foi esse o engano cometido pelo ex-presidente Carlos Salinas de Gortari: convencer os mexicanos de que o país ia bem porque era isso que dizia a imprensa internacional e os administradores de fundos especulativos.

Tradução de Clara Allain

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