São Paulo, terça-feira, 18 de junho de 1996
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Uma verdade eleitoreira

JANIO DE FREITAS

As reformas constitucionais -lembra-se?- que eram indispensáveis para tudo, e cuja ausência era dada ainda há pouco como causa incontornável do imobilismo governamental, de repente estão reduzidas pelos governistas a mero motivo para mais uma exibição de política farsante.
De seis dias para cá, tornou-se frequente encontrar nos meios de comunicação frases como esta: "O presidente Fernando Henrique concluiu que é possível fazer a retomada do crescimento sem as reformas constitucionais". Ou então: "Ao esforço que seria necessário para aprovar as reformas no Congresso, Fernando Henrique prefere se dedicar à retomada do crescimento".
Os líderes de bancadas governistas, por seu lado, reuniram-se a meio da semana passada para tratar das reformas. Não da maneira de levá-las a avançar nas votações, já que faziam coro ao refrão fernandista de que as reformas eram indispensáveis para tudo. Reuniram-se para descartá-las. Concluíram, para uso jornalístico, que "a base parlamentar do governo está cansada, traumatizada com o processo tão longo de votação das reformas".
Conclusão fixada apenas 24 horas depois de Luís Eduardo Magalhães, presidente da Câmara, divulgar outro cansaço: o seu, por "ficar sempre aguardando pelas presenças por mais de uma hora", para iniciar qualquer votação. Esperar ou "ter que ficar chamando deputados". Cansaço tão grande que o levou à disposição de cortar diárias dos que faltassem em excesso. O excesso, é bom deixar claro, nada tem a ver com o que seria excesso onde quer que se trabalhe.
Pois bem, tanto o que parte da Presidência, dando as reformas como dispensáveis, quanto os pretextos de parlamentares governistas para não as votar são resultado de um acerto entre Fernando Henrique e os líderes do PFL.
Os pefelistas acharam que a votação de reformas não lhes poderia trazer nem um só benefício nas eleições municipais. As reformas a serem ainda votadas são a administrativa e a tributária, que só conseguiriam levantar reações contra os governistas.
Fernando Henrique aderiu à tese pefelista. Assim as reformas mudaram a sua natureza. De indispensáveis aos propósitos de cortar gastos governamentais e fazer o tão reclamado ajuste fiscal, como indispensáveis para a redução dos juros, a retomada do crescimento econômico e tudo o mais, as reformas passaram a ser um elemento apenas decorativo na memória. Como foi nos discursos, nas entrevistas, nos pretensas justificativas para a evidência de que nada mudou no país, em termos de organização e administração, desde a posse do governo dito modernizante.
Mas se um motivo eleitoreiro é suficiente para levar presidente e parlamentares governistas a exporem o que eram, de fato, as suas reformas -coisas desnecessárias e, por isso, agora dispensáveis- por que mantiveram o país pendente da falsa necessidade de tais medidas durante tanto tempo? Só há uma resposta possível: por irresponsabilidade, por leviandade. Para amparar a resposta, basta pensar na fábula de dinheiro que custaram à Nação, neste ano e meio, o governo e o Congresso mantidos em nome de uma necessidade mentirosa.

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