São Paulo, quinta-feira, 27 de junho de 1996
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PERIGO À VISTA

Sem o emprego de instrumentos realmente eficazes para prevenir ou mesmo dirimir os conflitos que hoje pululam por todo o país, era de se esperar que, cedo ou tarde, os graves confrontos entre sem-terra e proprietários rurais virassem caso de polícia. E, como em toda ocorrência criminal, nem sempre é fácil rotular "mocinhos" e "bandidos". Aliás, as mortes de três funcionários de uma fazenda no Maranhão em recente confronto com sem-terra indicam que, ao contrário da imagem pública que o MST soube forjar, também entre seus membros há os que cometem crimes contra a vida e não apenas contra a propriedade. A apuração precisa ser rigorosa.
No caso, porém, da batalha travada em 17 de abril último no Pará, com a morte de 19 sem-terra em confronto com 155 policiais militares, são fortes os indícios de que a corporação, tal como os sem-terra, agiu ao arrepio da lei, ao exorbitar de sua atribuição de manter a ordem pública.
Não obstante, segundo levantamento desta Folha, várias irregularidades podem ser observadas nos inquéritos que apuram o massacre, as quais poderão comprometer sua elucidação. Algumas mostram o primarismo de certas investigações no país. Testemunhas importantes não receberam ainda segurança da PF; não houve reconhecimentos fotográficos nem acareações; 12 mortos tiveram seus corpos removidos antes da perícia para o exame de balística. Para piorar, o inquérito policial militar, que durou apenas 20 dias, apontou somente uma genérica "transgressão da disciplina militar", o que dificulta ao Ministério Público individualizar a conduta dos denunciados e assim definir com mais clareza os responsáveis pelas mortes.
Além disso, como caberá afinal à própria Justiça Militar, tradicionalmente inclinada ao corporativismo, julgar os policiais, torna-se inevitável suspeitar que o caso, lamentavelmente, caminhe para a impunidade.
Dada, porém, a grande comoção produzida pela tragédia, espera-se que a execrável suspeita acabe não se confirmando.

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