São Paulo, domingo, 7 de julho de 1996
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No café holandês

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

A "Forbes", prestigiada revista norte-americana do mundo dos negócios, abriu suas páginas, na edição de 12 de junho, para tratar de... maconha.
Sim, a "Forbes" também fala de maconha, especialmente quando as folhas verdes da "cannabis sativa", que Bill Clinton diz que fumou, mas não tragou, transformam-se em notas de dinheiro. Mais ainda, quando essa metamorfose lucrativa é legal -como acontece na Holanda.
A reportagem, que recebi via fax de um insuspeito amigo empresário, trata da estratégia holandesa para enfrentar o problema das drogas.
Diz a apresentação: "A Holanda, fonte do puritanismo americano, tornou-se a sociedade ocidental mais permissiva em relação à maconha e ao haxixe. Por uma boa causa?" O título responde: "Diga simplesmente talvez".
Vamos aos números, segundo pesquisas citadas pela revista: a Holanda tem 1,6 usuários de "drogas pesadas" (cocaína e heroína) para cada mil habitantes. A França tem 2,5, a Itália 3 e a pacata Suíça tem 5.
Os EUA não aparecem nessas pesquisas, mas dados da ONU mostram que pelo menos 7% dos norte-americanos usam maconha e haxixe frequentemente. Na Holanda são 4% os fregueses habituais.
Como funciona a Holanda? Simples: o governo tornou legal, dentro de certos limites, a posse, o consumo e a venda de maconha e haxixe.
Paralelamente, pratica uma política fortemente repressiva em relação às drogas pesadas.
Pode-se comprar e fumar um cigarro de maconha num café. Mas, se alguém ali estiver consumindo ou vendendo cocaína ou heroína, o negócio é fechado e o dono responde criminalmente.
Com isso, o governo holandês retirou do consumo de drogas leves o manto do crime e da marginalidade. E atraiu os usuários e comerciantes, todos à luz do dia, para seu lado -eles são os maiores interessados em manter distância do negócio das drogas pesadas.
Os cafés que vendem drogas leves na Holanda chegam, hoje, a 450. Entra-se num deles, pega-se um cardápio e pede-se o tipo predileto. Há, ainda, guloseimas e produtos que crescem em torno do negócio principal -que movimenta, legalmente, milhões de dólares.
Mas EUA e Europa vivem a pressionar a Holanda para mudar sua política. O que têm a oferecer para provar que estão certos? Nada. Apenas a fumaça escura do moralismo e da irracionalidade.

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