São Paulo, domingo, 7 de julho de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Estudo relaciona câncer e comida

DA REPORTAGEM LOCAL

Cidades brasileiras da região Nordeste ou da região Sul têm dietas típicas diferentes. E, provavelmente também por causa disso, têm índices de casos de morte por câncer também diferentes.
Um estudo realizado com base em dados de dez capitais brasileiras examinou a relação entre a dieta e as taxas de mortalidade dos principais tipos de câncer no Brasil, a segunda principal causa de mortes no país.
Descobriu-se, por exemplo, que o câncer de esôfago está ligado ao consumo de mate e que entre as cidades com maior índice desse tipo de doença estão as da região Sul do país, onde é também maior o consumo da bebida quente feita do chá: Porto Alegre, por exemplo.
As conclusões da pesquisa "Dieta e Mortalidade para os Tipos mais Frequentes de Câncer no Brasil" foram publicadas na edição de janeiro/fevereiro/março dos "Cadernos de Saúde Pública", da Fundação Oswaldo Cruz.
No trabalho, a pesquisadora Rosely Sichieri, do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, e colegas fazem um estudo estatístico da relação entre tipos de dieta e câncer. Isto é, os cientistas não investigaram como, e em qual parcela exata da população, tal tipo de alimentos causou tal tipo de câncer.
"Mas nos casos em que encontramos correlações fortes podemos inferir que, em certas cidades, o consumo de certa categoria de alimentos está ligado a um tipo da doença", diz Sichieri.
Os pesquisadores analisaram a associação das taxas de mortalidade dos tipos de câncer mais comuns no país com aqueles elementos da dieta que, em outros estudos, foram tidos como potencialmente causadores da doença.
A composição da dieta "típica" de cada cidade foi extraída de uma pesquisa realizada em 1974 e 1975 pelo IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) -o "Estudo Nacional de Despesa Familiar". Durante sete dias, foram medidas as quantidades de todos os ingredientes empregados na elaboração das refeições e dos alimentos ingeridos fora de casa.
Sichieri e seus colegas cruzaram esses dados com as estatísticas de câncer do Ministério da Saúde para os anos de 1987 e 1989 (tempo para que aquela dieta "típica" pesquisada "fizesse efeito").
Vitaminas
O trabalho mostrou que a mortalidade devida ao câncer de estômago era "negativamente associada" ao consumo de frutas e de alimentos que contêm vitaminas A e C e fibras (cereais, feijão, vegetais). Isto é, nas capitais brasileiras onde é maior o consumo desses produtos há menos casos mortais desse tipo da doença: São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador, por exemplo.
As vitaminas também mostraram-se ligadas a um número menor de casos mortais de outros tipos de câncer. A vitamina A foi "negativamente associada" às mortes por câncer no esôfago, que mata preferencialmente recifenses, curitibanos, porto-alegrenses e belo-horizontinos.
Moradores de São Paulo, Rio e Belém estão entre os que menos sofrem com a doença nas cidades pesquisadas.
A vitamina C foi relacionada à ocorrência de menos casos mortais de tumores malignos na próstata. Os campeões absolutos da doença são os moradores de Fortaleza, com 96,8 casos de morte por 100 mil habitantes. A taxa de mortalidade paulistana foi a menor, com 33,3 casos por 100 mil. Nas demais capitais pesquisadas, a taxa variou entre 42 casos por 100 mil e 63 casos por 100 mil.
O câncer no pulmão, além do fumo, foi curiosamente relacionado ao consumo de mate e de cereais. A cidade que lidera a lista de mortes pela doença é Porto Alegre, com 136 homens mortos em cada 100 mil. Curitiba vem a seguir, com 111,3 casos por 100 mil. Na capital do Estado do chimarrão, o Rio Grande do Sul, o mate aparece como um vilão dos tumores.
No caso do câncer do esôfago, ao qual o chá também está associado, Sichieri apresenta uma explicação. Estudos anteriores mostraram que a temperatura da bebida pode danificar o tubo que liga a boca ao estômago.
Ainda segundo o estudo, os habitantes de Belém e Fortaleza podem estar sofrendo de câncer no estômago -são as cidades campeãs- devido ao grande consumo de ovos. Foi com esse tipo de alimento que foi encontrada uma "associação positiva" para os tumores malignos no estômago.
O câncer no seio, o tipo da doença que mais mata mulheres, não foi atribuído a nenhuma das categorias de alimentos, ou de substâncias nele contidas, analisadas pelos pesquisadores.
Sichieri realizou a pesquisa com James Everhart, do Instituto Nacional de Diabetes e de Doenças Digestivas e do Fígado dos Estados Unidos, e com Gulnar Mendonça, do Instituto Nacional do Câncer.

Texto Anterior: Testemunhos da beleza edênica
Próximo Texto: Pobres comem pouco e mal
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.