São Paulo, domingo, 7 de julho de 1996
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A saúde e a mente

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Permita-me, caro leitor, iniciar o tratamento de um assunto sério de maneira jocosa. Consta que, para aliviar a superlotação de um manicômio do Estado, os médicos decidiram testar os doentes em grupos de três para saber quais deles poderiam ter alta.
A todos foi perguntado quanto era 2 + 2. O primeiro disse que era quarta-feira. Decepção total! O segundo disse que era 17. Que tristeza! Mas, o terceiro acertou.
Entretanto, os médicos, antes de liberarem o paciente, decidiram saber como ele chegou àquela conclusão. A resposta foi catastrófica: "Muito simples. Prestei atenção no que os outros disseram. Está na cara, quarta-feira menos 17 dá 4!" O manicômio continuou lotado.
Essa anedota me veio à mente ao ler num estudo do Ipea/ONU a reafirmação de que as moléstias mentais são o primeiro item de dispêndio público e a segunda causa de internação nos hospitais do Brasil (Relatório sobre o Desenvolvimento Humano, 1996).
Isso é muito estranho, pois as doenças cardíacas, que matam cerca de 240 mil pessoas por ano (30% do total de óbitos), vêm em terceiro lugar.
Tratei desse assunto nesta mesma coluna em 20/3/94. De acordo com o Ministério da Saúde, naquela época os gastos com psiquiatria já estavam disparados na frente, num país onde as crianças são vítimas de infecções intestinais e outras doenças corriqueiras.
Tudo isso é bastante estranho. Deve haver muito mais coisas voando nos céus do Brasil além de pássaros, aeronaves e fantasmas...
Respeito muito a ciência e os profissionais da psiquiatria. Mas o código civil classifica os doentes mentais como incapazes, o que os impede de testemunhar em apurações de eventuais irregularidades no seu tratamento e internação. Doença mental como principal item de despesa... ora essa!
Será que um mero aumento de impostos é capaz de corrigir essa inversão de prioridades? Penso que não. O Brasil está cheio de exemplos de problemas que foram agravados depois da elevação de tributos.
Vejam o caso da Lei Calmon, cujos propósitos sociais são indiscutíveis. Pois bem, foi só elevar os recursos da educação para 25% sobre o total de tributos pagos para a sonegação aumentar -o que fez encolher os recursos que chegam às escolas.
Nossos governantes têm de entender que a redução de alíquotas e a diminuição do número de impostos é o passaporte para ampliar a base dos que pagam e aumentar o montante do que se arrecada.
Num momento em que o Congresso Nacional se prepara para aprovar a reforma tributária -finalmente!- não há por que gastar tempo na análise de contribuições isoladas como a CPMF.
Depois de esperar tanto tempo convém, agora, aguardar a nova estrutura tributária. Afinal, os parlamentares foram convocados extraordinariamente para tal fim e, tenho certeza, saberão cumprir com suas obrigações. O bom senso recomenda não colocar o carro na frente dos bois.

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