São Paulo, sexta-feira, 12 de julho de 1996
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Críticas sem saúde

JANIO DE FREITAS

As reações à inesperada aprovação inicial do imposto para a saúde, ou CPMF, congestionaram os meios de comunicação com uma carga de críticas que valeu como uma exibição da incoerência que é servida à opinião pública.
Até no nome, Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira-CPMF, o imposto sugerido pelo ministro Adib Jatene é cópia do Imposto Provisório sobre a Movimentação Financeira-IPMF, criado em 93 pelo então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso. Além de abrandar a primeira palavra, a proposta de Jatene atenuou algo mais importante: o IPMF era de 0,5%, a CPMF seria a metade, 0,25. Pelos acordos preparatórios da aprovação, caiu mais, para 0,2%. Sua mordida vem a ser, portanto, 40% do que era a dentada do IPMF.
Relegados os porcentos e entrando na real, em cada R$ 100 de movimentação financeira o IPMF tomou R$ 0,50 e a CPMF tomará R$ 0,20. Vinte centavos, isso mesmo. E, no entanto, a aprovação submeteu a CMPF a uma enxurrada de acusações de ser inflacionário - mas o IPMF de Fernando Henrique, tão maior, não foi submetido à mesma torrente nem, muito menos, foi depois identificado como causador da inflação crescente na época.
Ainda que se evitem comparações com os tempos anteriores ao Plano Real, a CPMF pode questionar a miopia voluntária dos seus ferozes críticos. O aumento dos combustíveis, por exemplo, oferece boa confrontação. Com toda a economia andando sobre pneus, por serem as rodovias muito mais lucrativas para as empreiteiras do que as ferrovias, o aumento dos combustíveis sempre foi um fator inflacionário.
Foram lógicas, então, nas vésperas e em seguida ao mais recente aumento, as previsões de que provocaria alta expressiva do índice de inflação. A previsão perdeu-se no espaço: muitos dos seus autores, sem as citar, passaram a celebrações do oposto, ou seja, de que nem o aumento dos combustíveis foi capaz de tirar a inflação dos seus níveis rasteirinhos. A esta altura, o aumento já é bem maior do que os 10% inicialmente combinados entre interessados e governo, mas sua ação deletéria sobre a inflação não se manifestou. Os 0,2%, porém, são considerados ameaça terrível à inflação baixa.
Nem só de fuzilaria indiscriminada fez-se a reação à CPMF. Foi comovente a preocupação de numerosos jornalistas com a possibilidade de que o rendimento da caderneta fique abaixo da inflação, por causa do imposto de 0,2%. Um jornalista, que nem é do bando de chapas-oficiais, teve um achado com tudo para pegar: "Com esse imposto, a poupança passou a ser uma aplicação para prejuízo".
Como o nome indica, o desconto incide sobre movimentação financeira. Logo, não atinge a caderneta de poupança como todo, mas só em caso de movimentação, só sobre a quantia sacada (é esperado que, em sua forma final, a incidência não atinja a retirada que o poupador faça para sua própria conta, porque haveria dupla incidência sobre o mesmo poupador). Por aí, a coisa já ficou um pouco menos comovente.
Volta a sê-lo, porém, e em dose merecedora de muito mais lágrimas. Porque os atuais preocupados com a sorte da caderneta não emitiram uma só palavra para defendê-la nos últimos meses, em que o Plano Real está, aí verdadeiramente, dando a ela remuneração menor do que a inflação. Mas criticar a CPMF atinge o ministro Jatene e o Congresso que a aprovou. Ao passo que criticar as perdas já havidas da caderneta levaria a criticar o incriticável.

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