São Paulo, sábado, 24 de agosto de 1996
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Consenso de Washington pode dar munição contra tucanos

OSCAR PILAGALLO
EDITOR DE DINHEIRO

Se precisassem de munição, os candidatos a prefeito que fazem oposição ao governo federal poderiam recorrer a uma coletânea de artigos de economistas identificados com, quem diria, os princípios neoliberais do que ficou conhecido como o Consenso de Washington.
"A Nova América Latina" levanta dois problemas que os tucanos preferem minimizar e que podem ganhar peso com a eventual federalização do debate eleitoral.
Um deles é o espectro do déficit da balança comercial; o outro é o papel desestabilizador do aumento da pobreza, resultante da expansão insuficiente da economia.
O desequilíbrio na balança remete ao câmbio. "As taxas de câmbio nominais fixas tendem a distrair os políticos e o público da real necessidade de implementar políticas e manter a âncora fiscal", advertem Shahid Javed Burki e Sebastian Edwards, do Banco Mundial.
A lição é tirada da crise cambial do México de 1994, mas se aplica ao Brasil, porque apesar de o real não ter paridade fixa está indiscutivelmente sobrevalorizado (a discussão é em quanto).
Os autores reconhecem que a situação do Brasil é mais sólida até porque "quando o Plano Real foi lançado, a moeda estava claramente desvalorizada, o que deu margem à valorização".
O alerta, no entanto, ganha importância no momento em que a balança comercial caminha para um déficit que, segundo projeções independentes, poderia bater em US$ 3 bilhões no final do ano (o governo já admite US$ 2 bilhões).
O ministro da Fazenda, Pedro Malan, procura demonstrar tranquilidade. Identifica histeria catastrofista na advertência de que o barco do Real pode acabar fazendo água pelo buraco do setor externo.
Mas a preocupação existe. Ou o governo não teria lançado mão de tarifas sobre importações e cotas, para desalento dos defensores do livre comércio.
"É sinal de que o real está se tornando supervalorizado, havendo a tendência de usar a proteção como substituto da desvalorização real", constata William Cline, do Institute for International Economics.
Embora a observação date de um ano atrás -quando foi realizada a conferência da Fundação Getúlio Vargas que deu origem ao livro-, o fato de persistirem cotas e tarifas a mantém atual.
Contando a renda
A questão da distribuição de renda tem mais apelo para o debate eleitoral.
O livro cita estudo do Banco Mundial, segundo o qual é necessária uma taxa média de crescimento de 3,2% ao ano para reduzir os níveis absolutos de pobreza na América Latina.
Medido apenas contra esse parâmetro, o Brasil, que segundo o IBGE deve ter expansão de 2,6% neste ano, não combate a pobreza.
É claro que há outros fatores, positivos e negativos. Do lado positivo, há o inegável impacto da queda da inflação na redistribuição da renda (o que não é mencionado por Burki e Sebastian).
Finalmente, Juan Luis Londoño, também do Banco Mundial, aponta a origem do problema. "O fator que mais contribuiu para o aumento da pobreza e a persistência da desigualdade foi sem dúvida a educação deficiente de adolescentes ao longo de várias gerações."
Para ele, a falta de prioridade na educação é responsável pelo ciclo vicioso em que o despreparo prejudica a expansão da economia que, por sua vez, perpetua a falta de educação.
"O persistente desequilíbrio na formação do capital humano é um dos elementos fundamentais que contribuem para o fraco desempenho global da economia latino-americana", resume Londoño.

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