São Paulo, quinta-feira, 29 de agosto de 1996
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Negros aderem a Pitta por pragmatismo

PAULO HENRIQUE BRAGA
DA REDAÇÃO

Um grupo de pessoas ligadas ao movimento negro abandonou os "rodeios" ideológicos da esquerda e está vendo em Celso Pitta a primeira oportunidade concreta de chegar ao poder.
Há cerca de quatro meses funciona no centro de São Paulo um comitê que busca aumentar o apoio a Pitta entre os negros.
"A idéia é que, desta vez, as pessoas da comunidade negra vão ter a total participação no poder", diz José Roberto Degolação, um dos coordenadores do grupo Total Participação e membro do comitê central da campanha.
Sociólogo, ele trabalhou na Prefeitura de Diadema após a vitória do PT na cidade, em 82. Seu apartamento, na avenida São João (região central de São Paulo), funciona hoje como sede do comitê de apoio a Pitta.
"É como um cavalo que estivesse passando na minha frente, é uma oportunidade de mobilizar a comunidade negra como nunca tivemos antes", afirma o também sociólogo Edson Roberto de Jesus, que coordena o trabalho de campo do grupo.
Jesus, que foi militante do PC do B por mais de dez anos, diz que o apoio a Pitta não é uma mudança ideológica. "Não abandonei as convicções socialistas."
Ele monitora a ação de 104 cabos eleitorais que fazem o corpo-a-corpo com o eleitorado negro na rua e em entidades ligadas à comunidade negra: escolas de samba, festas e eventos em salões de baile, centros de candomblé e umbanda.
Os dois acreditam que uma das causas do avanço de Pitta nas pesquisas é a adesão do eleitorado negro. Para Jesus, a esquerda faz uma discussão "sectária" do racismo e dos problemas da comunidade, e seu discurso não tem penetração.
"Nenhum partido de esquerda discute a questão racial seriamente. O PPB também não faz isso, mas teve sagacidade suficiente para perceber essa necessidade de mudança", afirma.
Degolação, por sua vez, avalia, a partir de sua experiência no PT, que o partido "não dava participação" ao negro.
Segundo Jesus, se Pitta vencer, "o movimento negro vai ter que entrar na discussão de como gerir, participar do poder".
Modelo
Degolação acredita que Celso Pitta tornou-se um referencial para o eleitorado negro das classes mais baixas.
"O camarada tinha antes o modelo do jogador de futebol, todo mundo queria ser Pelé. De repente, Pitta já é uma referência para o eleitorado negro, da periferia, das classes C e D. Isso é irreversível, está mudando a história do Brasil."
Jesus e Degolação acreditam que o eleitorado negro está conseguindo "se enxergar" em Pitta, mas fazem questão de frisar que ele não é um candidato do movimento negro, mas "de São Paulo".
Eles dizem que, se Pitta for eleito, os negros não terão garantia automática de que seus interesses serão defendidos pela administração municipal, mas terão de estar mobilizados para reivindicar.
"Eu não gosto de dizer que, porque ele é negro, vai ajudar a comunidade negra. Se ele fizer creches na periferia, por exemplo, já está ajudando", diz Jesus.

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