São Paulo, sábado, 21 de setembro de 1996
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Chance de confrontar idéias

EZIDIO PINHEIRO
Engana-se quem acreditava que a UDR havia desaparecido. O movimento sempre existiu, a sigla é que estava abandonada devido à nova conjuntura política.
Ora, está claro que a UDR está muito bem representada pela bancada ruralista. Obstruir os projetos que tramitam no Congresso em prol da reforma agrária é uma velha ação da UDR executada fielmente pelos integrantes da Frente Parlamentar da Agricultura.
Conheço esse grupo há muitos anos. Quando ainda era diretor da Contag, percorri o interior do Brasil fazendo assembléias com trabalhadores rurais a fim de viabilizar econômica e socialmente a agricultura familiar, e seus representantes estavam presentes para impedir, por meio da coação, que os trabalhadores se organizassem. Afirmo, com exceções, que o comportamento dessas pessoas é o mesmo de 25 anos atrás.
Os representantes desse movimento apenas tiraram a máscara e avisaram: "Olha, nós defendemos os princípios que constituíram a UDR, não queremos dividir a terra, não negociamos com sem-terra e vamos defender nossas propriedades armados". A verdade é que eles nunca desapareceram, mas não foram capazes, com suas idéias, de impedir que a luta pela reforma agrária e as ocupações continuassem.
As ameaças dos latifundiários não vão emperrar as negociações pela democratização da terra. Pelo contrário, vão auxiliar o processo, pois agora teremos a oportunidade de levar a público o confronto de idéias sobre o problema da terra; a população poderá identificar quem é quem.
São anos de debates, conflitos e mortes. Nesse período, a política do país mudou, vivemos em uma democracia, e a população está acompanhando a discussão sobre a reforma agrária.
O governo está com a "faca e o queijo na mão", pois ele quer fazer a reforma, e as pesquisas apontam que a maioria da população também defende a distribuição da terra. A atitude criminosa da UDR de fomentar a luta armada pode aumentar os conflitos violentos no campo, mas também será motivo para acirrar o debate dentro do Congresso, o que poderá agilizar a tramitação dos projetos que se referem à reforma agrária, e que andam vagarosamente.
Se o governo quer, se a população quer, cedo ou tarde o Congresso Nacional vai ter que acatar esse desejo com ou sem bancada ruralista. É óbvio que são negociações de longo prazo; a injusta estrutura fundiária do Brasil é secular e não será resolvida em curto prazo. Mas as negociações não retrocedem por causa de uma sigla que sempre esteve presente nos campos do país.

Ezidio Pinheiro, 51, é deputado federal pelo PSDB do Rio Grande do Sul e coordenador do Grupo Parlamentar da Agricultura Familiar do Congresso Nacional. Foi presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul (1989-94) e vice-presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (1986-89).

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