São Paulo, sábado, 21 de setembro de 1996
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O papa e a CIA

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - "Um papa polonês é a primeira brecha aberta na partilha do mundo feita em Ialta." A constatação é de um filósofo marxista, Laslek Kolakowski, logo depois da eleição do cardeal Karol Wojtyla.
Foi, na realidade, o início da queda do Muro de Berlim, muro que concretizou em pedra e cimento a partilha feita em Ialta, ao final da 2ª Guerra Mundial.
De Ialta em diante, a antiga URSS tornou-se superpotência militar e, como tal, não podia aceitar rebeliões ideológicas ou políticas. Invadiu a Hungria em 1954 e a Tcheco-Eslováquia em 1968. Estava pronta para invadir a Polônia em 1981.
A política é como o futebol: quem não faz, leva. O Kremlin não acreditou que um polonês eventualmente na liderança de 1 bilhão de católicos tivesse força para resistir à invasão. Afinal, como dizia Stálin, o papa não tem divisões.
Eu estava em Varsóvia e Cracóvia na semana em que as tropas soviéticas já criavam pequenos incidentes na fronteira a fim de justificar a invasão que ocupasse Gdansk. As igrejas se encheram de soldados. O papa mandara um recado: ficaria com seus compatriotas na resistência. As tropas soviéticas se recolheram.
Essa foi, para todos os efeitos, a segunda brecha aberta na partilha de Ialta. Depois veio a "Guerra nas Estrelas" de Reagan, a transparência e a abertura de Gorbatchov: como sistema político, a URSS já era. O anunciado livro de Bernstein que investigou as relações do papa com Reagan e a CIA vai revelar o sabido. A URSS jamais seria destruída militarmente: de Napoleão a Hitler, nenhum invasor conseguiu se apoderar da santa terra da Santa Rússia.
Contudo o gigante estava em coma: caiu sem dar um tiro. Resta a questão ideológica: o socialismo não acabou com a URSS. E o papa deu uma direção nova à igreja ao dizer, em Puebla, que o capital deve ser gravado com uma hipoteca social.

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