São Paulo, terça-feira, 24 de setembro de 1996
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Madrasta leva enteados de 13 e 14 anos para vender chicletes na rua

DA REPORTAGEM LOCAL

Os irmãos G.E.S., 13, e L.E.S., 14, ganham todos os dias cerca de R$ 20 cada um vendendo chicletes no cruzamento da rua Oscar Freire com avenida Rebouças (Jardins, zona oeste de São Paulo).
O dinheiro todo é entregue para a madrasta, Adevanir Paes Peixoto, 39, que os traz diariamente de Santo André (Grande São Paulo).
Adevanir tem outros dois filhos, de 5 e 3 anos, que ficam em casa. "Trago só os mais velhos", diz.
Os três passam até seis horas por dia na esquina. Adevanir não vende, apenas "supervisiona" o trabalho dos enteados.
"Eu sei que eles não podem trabalhar, mas meu marido está desempregado há um ano e meio. Que é que eu vou fazer, roubar, matar? Não posso. Morador de favela também paga água, paga luz."
L.E.S., o mais velho dos irmãos, diz que não se importa de trabalhar na rua. "É mais gostoso do que ficar em casa", diz.
Segundo ele, a família tem dois carros, "um Opala e uma Variant". O irmão menor, G.E.S., diz que o pai os leva de carro até a estação de trem de Santo André e os busca no final do dia. "Para trazer para cá gasta muita gasolina", diz.
Adevanir é analfabeta. "Morava na roça, no interior do Paraná, meus pais não achavam importante", diz. Os dois filhos estudam em uma escola pública em Santo André, na 2ª e na 3ª séries.
O porteiro do prédio em frente ao "ponto" da família, no entanto, diz que eles frequentemente estão lá também de manhã.
Adevanir se desculpa: "Hoje (ontem) eles perderam o horário. Mas normalmente eles estudam até as 12h e depois nós vimos para cá, chegamos umas 14h30, 15h."
Na sexta-feira, quando o fotógrafo da Folha ficou acompanhando o movimento na esquina, os três já estavam às 13h.
Os funcionários do prédio dizem ainda que Adevanir fica o dia todo sentada, à espera do dinheiro conseguido pelos enteados. "E quando chove ela se esconde na padaria, enquanto os garotos ficam tomando chuva", diz o porteiro, que não quis se identificar.
Na esquina aonde Adevanir leva os filhos, ficam pelo menos dez garotos vendendo chicletes. Todos moram em Santo André.
F., 6, o menor deles, diz que gostaria de ficar em casa "vendo desenho". "Minha mãe manda eu vir aqui para ela comprar arroz e feijão", diz. Ele estava ontem na rua acompanhado da irmã, C., 12.
J.F.S., 8, estava com a irmã A.F.S., 13. "Gosto mais de ir para a escola, para aprender a ler, escrever, para ter uma vida."

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