São Paulo, domingo, 29 de setembro de 1996
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Defensor do "Fura-Fila", Pitta não sabe o valor da passagem de ônibus

GEORGE ALONSO
DA REPORTAGEM LOCAL

Ex-secretário de Finanças de Maluf diz que ajudou a definir tarifa de R$ 0,85, mas custo é de R$ 0,80

Líder na disputa pela Prefeitura de São Paulo com 38% das intenções de voto, Celso Pitta (PPB), que completa hoje 50 anos, não sabe quanto custa uma passagem de ônibus na cidade. "Como secretário de Finanças, participei da definição da tarifa, que foi de R$ 0,85." A tarifa hoje é de R$ 0,80.
Carioca, também não soube dizer onde ficam alguns bairros que percorreu em carreatas. Considera que isso não tem importância e diz que conhece a cidade por ter sido secretário por três anos.
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Folha - O sr. é um político novo. O que aprendeu de bom e de ruim com a política na campanha?
Celso Pitta - De bom, aprendi que você não precisa desvirtuar sua personalidade para entrar na política. De ruim, é que há ainda a política velha, voltada para denúncia, ofensa pessoal, difamação.
Folha - O sr. foi difamado?
Pitta - Se você considerar as últimas semanas do horário gratuito, vai verificar facilmente que eram todos contra Pitta.
Folha - O prefeito Maluf admitiu que, no passado, já mentiu em sua vida pública. O sr. crê em tudo o que diz sua publicidade?
Pitta - Não só acredito como tenho absoluta certeza que tudo o que coloquei na minha proposta de governo é exequível. Fui formado para ser executivo. O que é diferente de outros candidatos, que têm formação política próxima ao Legislativo.
Folha - Mas ele admitiu que exagerou em muitas coisas...
Pitta - O que ele colocou é que pontos de sua proposta foram cumpridos. Outros pontos não. Daí a necessidade de continuidade administrativa.
Folha - Qual foi o pior momento de sua campanha?
Pitta - O momento mais delicado foi quando as pesquisas me colocaram na liderança, em ascensão meteórica, com até 47%, na primeira semana de setembro. Fiquei preocupado com o que viria depois, a massificação de ataques à minha pessoa e ao Maluf.
Folha - Durante a campanha ocorreram dois incêndios trágicos, denúncias comprovadas de troca de votos por carteiras do PAS e inscrições no Cingapura.
Pitta - As denúncias não foram comprovadas. Sempre exigi a apuração, inclusive a cassação de registro dos candidatos a vereador (sobre as denúncias do PAS e do Cingapura). No caso dos incêndios, aguardamos as perícias.
Folha - Maluf vai a carreatas e fala como se fosse o candidato. Quando será o seu "Independence Day"? Existirá esse dia?
Pitta - Não digo que meu "Independence Day" foi em 29 de setembro de 1946 (data de nascimento de Pitta), porque não poderia ser tão rigoroso. É falsa a hipótese de não haver independência na minha vontade tanto na campanha como na prefeitura, se eleito. Sou independente, mas leal.
Folha - Se o sr. for eleito, Maluf tem interesse pessoal no sucesso de sua gestão, pelo menos até 1998, quando quer se candidatar a presidente ou governador do Estado. O sr. vai aceitar algum tipo de ingerência na sua gestão?
Pitta - Boas idéias de pessoa que foi prefeito serão bem-vindas.
Folha - Os adversários falam que o sr. é um fantoche, sem idéias próprias.
Pitta - Todas as tentativas de colar apelidos foram malsucedidas. A resposta veio do eleitor.
Folha - O "Fura-Fila" surgiu na campanha como um coelho na cartola. Para alguns técnicos, o "Fura-Fila" é mais adequado a cidades médias. A proposta não "sobrevoa" os problemas do trânsito?
Pitta - A proposta é honesta. Complementa o ônibus, o metrô e os corredores exclusivos para ônibus. Os ônibus convencionais congestionam muito as ruas.
Folha - Há quem fale que o sr. se parece com Collor no seguinte ponto: um desconhecido guindado à posição de líder na disputa.
Pitta - Essa assertiva foi feita pela primeira vez por José Serra. Mais parecido do que eu é o governo federal. Tem dois ministros do governo Collor, inclusive aquele que confiscou a poupança.
Folha - O PPB está distribuindo milhares de bonés e camisetas. O sr. não acha que isso é uma espécie de "coronelismo pós-moderno"? Em vez de comida, roupa.
Pitta - Não. Não é um gênero de primeira necessidade. A pessoa pode não pegar ou jogar fora.
Folha - Em suas carreatas, o sr. percorreu dezenas de bairros, como Jardim Filhos da Terra e Vila Nhocuné. O sr. sabe onde ficam esses bairros?
Pitta - A Vila Nhocuné fica em Vila Alpina (a Vila Nhocuné, na verdade, fica na Vila Matilde, zona leste). Não vou agora dissertar sobre geografia de ruas. Não conheço o Jardim Filhos da Terra, nem sei se existe (Pitta foi a essa região, no Tremembé, zona norte, em meados de agosto).
Mas não se pode dar a essa entrevista o tom de almanaque da cidade. Se for isso, pego o guia. Se o cerne da pergunta é saber se conheço a cidade, digo sim. Exerci o cargo de secretário das Finanças por três anos e percorri a cidade com o prefeito em inaugurações.
Folha - Quanto custam a passagem de ônibus e um pãozinho?
Pitta - Como secretário de Finanças, participei da definição sobre a tarifa de ônibus, que foi de R$ 0,85 (na verdade, é R$ 0,80). Sei que o pãozinho normal custa R$ 0,20 (na realidade, varia de R$ 0,06 a R$ 0,15), embora não compre pão na padaria. Prevenido sobre perguntas desse teor, minha assessoria encaminhou lista de preços de produtos, o que me coloca em posição confortável.
Folha - O Cingapura é um pilar de sua campanha, mas pouco foi feito. O sr. não acha que houve exagero de marketing?
Pitta - A prefeitura investiu também nos projetos da Cohab e nos mutirões. Reiniciamos o pagamento de contas herdadas da administração anterior com a Caixa Econômica Federal. Ao considerar uma eventual timidez do programa Cingapura em relação às necessidades da cidade, você tem de situar essas limitações. Não recebemos qualquer aporte federal ou estadual. Até dezembro, vamos entregar 9.000 unidades. Averigue se o morador acha o Cingapura obra de marketing.
Folha - O sr. tinha menos rejeição no início da campanha. Segundo o Datafolha, cerca de 30% já rejeitam o seu nome.
Pitta - Não se chuta cachorro morto. Se eu não estivesse incomodando, não teria essa rejeição. Como estou na liderança, estou contrariando muitos adversários.
Folha - Agora, na TV, o sr. disse que vai priorizar obras sociais. Não é uma contradição?
Pitta - Vou enfatizar mais ainda o setor social. É uma contradição, se você acha que gerar 100 mil empregos por meio de obras não tenha sentido social. Social é toda atividade do governo. Você está investindo para que as pessoas gastem menos tempo no transporte, no trânsito. Social não é dar um pratinho de sopa no final da tarde. Fizemos o PAS, que está resolvendo o problema da saúde.

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