São Paulo, domingo, 29 de setembro de 1996
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A greve e o FMI

CELSO PINTO

O que há de comum entre a greve geral que paralisou a Argentina esta semana e o "Panorama da Economia Mundial 1997", documento divulgado também esta semana pelo FMI? Mais do que se possa imaginar. Num certo sentido, um é o exemplo prático do que quer dizer o outro.
O estudo do Fundo dá a chancela oficial para uma discussão que vem empolgando acadêmicos e governos dos países desenvolvidos no último ano. Os países devem tentar chegar à batalha final contra a inflação e zerá-la, ou conviver com uma pequena inflação?
O FMI endossou a tese que o ideal não é ter inflação zero e sim uma "pequena taxa positiva". A discussão só é possível, é bom lembrar, porque, hoje, 18 países da OCDE estão com taxas de inflação anual abaixo de 3%. Alguns exemplos: 0,4% no Japão, 1,2% no Canadá, 1,4% na Alemanha, 0,6% na Suécia e na Suíça. Ao mesmo tempo, inúmeros países, especialmente na Europa, estão com taxas altíssimas de desemprego.
O FMI e outros economistas eminentes, como Paul Krugman, argumentam que o custo para zerar a inflação seria enorme, em termos de recessão e desemprego, para benefícios duvidosos. Primeiro, porque muitos economistas acham que existem imperfeições na medição da inflação e que um índice de 2% provavelmente já reflete uma inflação zero. Chegar ao zero poderia significar deflação, ou seja, queda nos preços.
Outro argumento mais complexo é que, numa economia, sempre existem setores que precisam reduzir custos para se ajustar. Uma coisa, contudo, é ter uma inflação de, digamos, 5% ao ano, e segurar custos reajustando os salários em apenas 2%. Outra é ter inflação zero e exigir que os trabalhadores aceitem uma redução nominal de 3% nos seus salários.
Se os salários não caem, o ajuste acaba se fazendo por aumento do desemprego. Krugman cita o caso do Canadá, que, com uma inflação baixíssima, tem hoje um desemprego de 10%, o dobro do dos Estados Unidos, ao passo que, nos anos 60, as duas taxas eram próximas.
Aí entra o caso da Argentina, onde a inflação anual em agosto foi de 0,2%, depois de vários meses de deflação. Num sistema de câmbio fixo e conversibilidade como o argentino, a tendência é encostar e permanecer numa inflação zero.
Ótimo para a inflação, mas significa que todos os ajustes de competitividade da economia exigirão reduções nominais de preços e salários. Ou um aumento ainda maior do desemprego, que já chega a 17%.
Nesse sistema, propor uma total "flexibilização" da política salarial, como está fazendo o governo argentino, não é uma questão de sadismo, mas de necessidade. Só que a sociedade, que já passou por reduções de salários nos últimos anos, está mostrando claramente que não quer inscrever o princípio em lei.
Sem flexibilidade, o desemprego pode aumentar ainda mais. Com ela, crescerá a revolta contra o governo. Não é por acaso que tantos acham que o fim da conversibilidade é apenas uma questão de tempo.
Na discussão sobre inflação zero, resta a pergunta final: que taxa de inflação é conveniente? Quem está na discussão fala em 3% ou, no máximo, 4% ao ano. Mas um estudo de Michael Sarel, do FMI, citado pelo "Financial Times", conclui que a taxa anual de inflação que melhor combina as vantagens dos preços baixos com maior crescimento é 8% ao ano. Por coincidência, a projeção da inflação brasileira para 1997.
Notificação do Banespa
A Associação Nacional dos Acionistas Minoritários do Banespa, Anamb, entregou ao governador paulista, Mário Covas, uma notificação judicial, com cópias para o ministro da Fazenda, o presidente do BC, o secretário da Fazenda paulista, o interventor do BC, o presidente da CVM e o presidente da Bolsa de São Paulo.
A notificação vai na esteira de vários processos abertos por ex-acionistas dos bancos Nacional e Econômico, que reclamam da inconstitucionalidade da liquidação. É uma ação preventiva: se o desfecho do caso Banespa for uma liquidação, do tipo Nacional, ou uma separação entre banco bom e banco ruim, como a do Banerj, a Anamb tentará anular o ato na Justiça. A notificação nasceu da fortíssima suspeita que o desfecho da novela Banespa está próximo e será exatamente esse.

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