São Paulo, quinta-feira, 9 de janeiro de 1997
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Pressa pela reeleição

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O ritmo super-acelerado que a Presidência está procurando imprimir à tramitação da emenda da reeleição vem provocando reações negativas.
Causa má impressão o contraste entre o dinamismo do governo nessa área e a sua morosidade no enfrentamento de questões mais fundamentais para o país.
Editorial da Folha de ontem observa, com razão, que o açodamento do Executivo atropela a pauta de votações do Congresso e impede uma discussão aprofundada do tema da reeleição.
Não há dúvida. No entanto, a pressa do governo era previsível. E não pode ser atribuída apenas ao evidente apego do presidente ao cargo.
Ao pleitear o direito à reeleição, o governo colocou-se numa posição delicada. Reduziu a política econômica a uma situação de semiparalisia, que não pode durar muito tempo mais.
O quadro macroeconômico brasileiro é mais frágil do que talvez possa parecer à primeira vista. Dados divulgados nas últimas semanas pelo Ministério da Fazenda e pelo Banco Central, se avaliados com certo cuidado, revelam claramente essa fragilidade.
A perda de dinamismo das exportações, por exemplo, é cada vez mais evidente. A taxa de crescimento do valor exportado caiu de 12,9% em 1994 para 6,8% em 1995 e apenas 2,7% em 1996.
Em consequência, o Brasil vem perdendo participação nas exportações mundiais. O desempenho brasileiro tem sido, inclusive, inferior ao da maioria dos países latino-americanos.
Estimativas da Cepal indicam que, em 1996, as exportações do resto da América Latina cresceram 13,1%, uma taxa quase cinco vezes maior do que a registrada pelo Brasil.
No segundo semestre do ano passado, o desempenho das vendas externas brasileiras sofreu deterioração mais acentuada. As exportações do primeiro semestre ainda foram 6,8% superiores às da primeira metade de 1995.
No terceiro trimestre de 1996, contudo, a taxa de crescimento caiu para 1,8% relativamente a igual período do ano anterior. No último trimestre, o resultado foi ainda pior: uma queda de 3,6% em comparação com o quarto trimestre de 1995.
Essa retração das exportações parece ter resultado não apenas da persistente sobrevalorização cambial e outros fatores que debilitam a competitividade internacional da economia, mas também da expansão da demanda interna e do consequente redirecionamento de vendas para o mercado interno.
Um aspecto pouco comentado é que essa mesma expansão da demanda interna deveria ter permitido alguma melhora das contas primárias do setor público, uma vez que tende a favorecer o aumento da arrecadação e a provocar redução de certos tipos de despesa.
Mas não foi o que aconteceu. As estatísticas divulgadas pelo Banco Central e pela Secretaria do Tesouro continuam, de um modo geral, a indicar resultados piores do que os de 1995, particularmente no que diz respeito ao orçamento primário, que exclui as despesas e receitas de juros.
O resultado primário do setor público consolidado (incluindo governo federal, Banco Central, governos estaduais, governos municipais e empresas estatais) passou de um superávit de 1,40%, em janeiro-outubro de 1995, para um déficit de 0,02% do PIB, em igual período de 1996.
Desse modo, a despeito de uma redução significativa da despesa de juros do governo, o déficit operacional continuou a acusar algum aumento em relação aos níveis já altos observados em 1995.
Enquanto isso, a dívida pública cresce a taxas extremamente elevadas. Nos 12 meses até novembro último, a dívida federal em títulos aumentou nada menos que 61%, passando de R$ 109 bilhões para R$ 175 bilhões.
Esse crescimento reflete não apenas a deterioração dos resultados fiscais, mas também o socorro financeiro a bancos públicos e privados, governos estaduais e outros setores. Reflete, além disso, a venda de títulos para neutralizar o impacto monetário interno de operações do setor externo.
A inconsistência da política econômica salta aos olhos. Parece óbvio que a situação está a exigir medidas politicamente difíceis, que poderiam tumultuar a aprovação da emenda da reeleição.
Nesse contexto, quanto mais cedo passar a emenda, melhor para o governo.
Aprovada a reeleição agora no início de 1997, a equipe econômica teria pouco mais de um ano para tomar as decisões dolorosas necessárias à contenção dos desequilíbrios das contas públicas e das contas externas.
Em 1998, com o governo plenamente engajado na campanha pela reeleição do presidente, a política econômica estará, de novo, rigorosamente submetida aos desígnios políticos de curto prazo.

E-mail: pnbjr@ibm.net

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