São Paulo, quinta-feira, 9 de janeiro de 1997
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A flexibilização do sigilo bancário

LUÍS NASSIF

Nos próximos dias, o Ministério da Justiça encaminhará ao Congresso Nacional minuta de projeto de lei dispondo sobre a "lavagem" de dinheiro -que, na prática, liquida com o conceito atual de sigilo bancário.
É matéria relevante, porém polêmica, especialmente após os recentes vazamentos de informações contra adversários do governo.
Na prática, obrigará toda instituição que transaciona bens -de corretoras de valores e corretores de imóveis a bancos e administradores de cartões de crédito- a prestar informações aos órgãos reguladores -ou, à sua falta, ao Conselho de Controle da Atividade Financeira (Coaf).
O Coaf será uma espécie de órgão de inteligência, subordinado ao Ministério da Fazenda e formado por representantes de órgãos públicos de regulação -todos indicados pelo próprio presidente da República.
O Congresso deve ficar atento à forma de indicação dos membros do Coaf, para se assegurar de que não será utilizado como instrumento de pressão política.
Draconiano
As empresas deverão identificar seus clientes, manter cadastros atualizados e registros de toda transação que ultrapassar limite fixado pela autoridade competente ou que possa ser considerada suspeita.
Essas informações deverão ser prestadas ao órgão judicial competente, em forma de segredo de Justiça.
O projeto tem alguns dispositivos draconianos -talvez necessários para enfrentar o crime organizado, na era das transações eletrônicas.
A empresa se comprometerá a guardar prazo de 24 horas antes de comunicar ao cliente sobre o fornecimento de suas informações à autoridade. A não-prestação de informações sujeitará os administradores a penas de advertência até a inabilitação para o trabalho.
O projeto é particularmente duro em relação à prisão preventiva. O juiz poderá negar fiança, mesmo que o réu seja primário e tenha bons antecedentes. Dependendo da decisão judicial, só lhe restará apelar, depois de preso.
Além disso, a pedido do Ministério Público ou da autoridade policial, ainda no curso do inquérito ou da ação penal o juiz poderá decretar a apreensão ou o sequestro de bens.
O bloqueio será levantado se a ação penal não for iniciada pelo menos 180 dias depois de concluída a diligência, ou desde que se comprove a origem legítima dos bens. Mas o pedido de suspensão deverá ser feito pessoalmente pelo acusado.
Crime variado
O projeto separa a punição da "lavagem" de dinheiro propriamente dita, dos chamados "crimes antecedentes" -aqueles que permitiram acumular dinheiro de maneira irregular.
Estão incluídos no projeto os frutos não só de operações de narcotráfico como de terrorismo, contrabando ou tráfico de armas, extorsão mediante sequestro, crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro nacional.
Prevê penas de reclusão de 3 a 10 anos para operações de "esquentar" dinheiro -incluídos aí super ou subfaturamento de exportações e importações.
Mas também a redução e até a suspensão da pena se os acusados colaborarem para a localização dos bens roubados.
A pessoa condenada, além da pena, terá seus bens confiscados pela União e não poderá mais exercer cargo ou função pública de qualquer natureza, nem tampouco participar como membro de conselho de administração ou de gerência de empresas privadas pelo dobro do tempo da pena que sofrer.
País armado
Com o projeto, o país terá instrumentos legais para enfrentar a escalada do crime organizado.
Falta, agora, uma ampla discussão para fixar os limites entre interesse público e direitos individuais.

Email: lnassif@uol.com.br

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