São Paulo, quinta-feira, 9 de janeiro de 1997
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Conheça a história da pesquisa

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

Em 1987, o casal Ruth e Victor Nussenzweig levou um choque. Laboratórios comerciais se desinteressaram por suas pesquisas para a invenção de uma vacina contra a malária.
Naquele ano, eles concluíram na Faculdade de Medicina da Universidade de Nova York, onde são professores, experiência com 12 pessoas, com o apoio do laboratório Hoffman-Laroche, da Suíça.
As 12 pessoas tomaram a vacina contra malária e, depois, foram picadas pelo mosquito que transmite a malária. "Estávamos viajando pela Europa e todos os dias ligávamos, ansiosos, para saber quantos contraíam a doença", diz Victor.
O resultado não animou os executivos da indústria farmacêutica. Dos 12 voluntários testados, apenas um saiu ileso. Significa que os laboratórios comerciais deveriam jogar ainda muito mais dinheiro até que descobrissem um dia a vacina. "Mas nós estávamos satisfeitos. Sabíamos que o princípio de nossa investigação ia pelo caminho certo", afirma Victor.
Nos macacos e ratos que se prestaram a cobaias na Universidade de Nova York a vacina funcionava.
Sem grandes laboratórios, entretanto, o projeto tendia a ficar no papel. Não tinha mesmo atrativos comerciais.
A malária atinge fundamentalmente pessoas pobres de países subdesenvolvidos. O princípio da vacina tinha sido descoberto em 1967 por Ruth. A malária é transmitida por meio da picada da fêmea do mosquito anofelino. O Anopheles injeta o parasita -ou melhor, sua forma chamada de esporozoíto- na corrente sanguínea. No organismo, o parasita cumpre a maior parte de seu ciclo reprodutivo e invade células do sangue e do fígado.
O casal viu que se injetassem num animal o parasita irradiado (desprovido de efeito maligno por meio de radiação), o corpo criava as defesas necessárias.
Mas, para uma vacina desse tipo, teriam de ser cultivados os mosquitos e deles retirados os parasitas. Cada ser humano precisaria de milhares para ser vacinado. É algo semelhante a lavar roupa com um conta gotas.
A pesquisa evoluiu quando os cientistas notaram que a solução estava não exatamente no parasita, mas numa proteína da "casca" que o envolve, a CS.
Na infecção pela malária, o sistema de defesa do organismo tem dificuldade de reconhecer o parasita invasor e convocar células para combatê-lo.
A CS é a proteína que daria o sinal para o corpo reagir à infecção, mas sozinha ela é incapaz de mandar uma mensagem suficientemente forte para o organismo. Era preciso "mensageiros" extras para ajudá-la, os adjuvantes.
Por meio de engenharia genética, produziram a CS em laboratório e a misturaram a pedaços do vírus da hepatite B. Essa "mistura" é a vacina, a substância que avisa o corpo que há invasores no corpo para serem combatidos.
O sucesso da descoberta da proteína CS colocou o casal no topo da investigação científica na área de imunologia, projetou-os na lista de candidatos a Prêmio Nobel e atraiu o apoio dos laboratórios comerciais.
A nova vacina, testada em laboratório, agora será aplicada "na prática", na África. "Essa é a fase final e vamos ver onde e como a vacina pode ser aprimorada até que malária deixe de ser um problema", diz Ruth.
(GD)

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