São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Freira americana discute o sexo de Deus

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Discutir o sexo dos anjos é considerado símbolo da perda de tempo. E discutir o sexo de Deus?
É o que a freira católica Karen Armstrong faz em seu livro "Uma História de Deus".
Ela defende a tese de que a imagem masculina de Deus, que se universalizou na cultura ocidental por meio da arte, do uso de pronomes masculinos para designá-Lo nas várias versões da Bíblia, da expressão "Pai Nosso" na mais famosa oração cristã, não tem fundamento teológico nem na tradição judaico-cristã nem em nenhuma das outras grandes religiões.
"Desde que Deus é espírito e transcende todas as categorias humanas, 'Ele' não pode ficar confinado a um gênero particular", afirma Armstrong.
Segundo ela, o primeiro livro da Bíblia, o "Gênesis", diz com clareza que homem e mulher foram criados à imagem e semelhança de Deus e, portanto, os dois sexos são capazes de expressar a "misteriosa essência divina".
Quanto à teoria de que a materialização de Deus na figura de Jesus Cristo, um homem, demonstra que Ele é homem, Armstrong afirma que o Concílio de Nicéia, em 325 d.C., que estabeleceu a doutrina da encarnação, foi cuidadoso ao escolher a palavra grega "anthropos" (homem, no sentido de humanidade) em vez de "aner" (o ser humano masculino) para designar no que o verbo havia tomado corpo.
A freira ainda afirma que os teólogos ortodoxos gregos realçaram ainda mais a assexualidade de Deus com a doutrina da Trindade, para que os cristãos não se sentissem tentados a pensar n'Ele como uma personalidade individual.
Na opinião de Armstrong, a insistência no Deus masculino tem um objetivo político claro nas religiões cristãs, que é manter as mulheres de fora do sacerdócio. Já que Deus é homem, Seus representantes têm de ser homens também.
Em outras culturas, inclusive a muçulmana, a masculinidade de Deus é muito menos delineada do que na cristã. Várias religiões da Antiguidade tinham mulheres como a principal divindade.
Mesmo entre os cristãos, a devoção à Virgem Maria, segundo Armstrong, tem sido uma forma para os fiéis compensarem a masculinização de Deus.
(CELS)

Texto Anterior: Mulheres sós chefiam famílias
Próximo Texto: Embaixador crê em saída pacífica para crise
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.